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À procura do ZEBRO (II)

Nos Cantos do Património

Por todo o país, do sul até ao norte, ainda se encontram topónimos alusivos ao ZEBRO, animal selvagem que habitou os montes e matagais da Beira na Idade Média. No Algarve encontramos o Zebro de Cima e Zebro de Baixo, o Vale de Zebro em Évora, Zebreira ou Azebreira em Idanha-a-Nova, Alto do Zebro em Oleiros, Horta do Zebro no Freixial e Monte Zebro em Trancoso. O Monte Zebro localizado numa zona da Serra da Broca que separa o amplo vale de Celorico do planalto de Marialva, nas proximidades de Tamanhos e Torres. Hoje é um ermo quase despida de vegetação mas outrora estaria coberta de carvalhos, castanheiros e matagal onde se abrigavam animais selvagens como os zebros. Destes, apenas subsistiu a memória na toponímia, baptizando algumas casas da serra da Broca.

Mas afinal o que era um ZEBRO?

Em alguns textos medievais sobre a arte da caça, o zebro era descrito como um animal semelhante a uma égua, com o pêlo acinzentado, “da cor dos ratos” com uma risca que percorria o dorso desde o lombo até à cauda e com o focinho escuro.

A palavra ZEBRO ou Zevro pode ter origem no termo árabe “ZARB” para designar “burro selvagem”. Assim, na origem etimológica da palavra “zebro” reside a explicação para o misterioso animal medieval. O ZEBRO era, simplesmente, um burro selvagem que se reproduzia por esses campos e montes cobertos de matagal. Foram caçados na Idade Média até à extinção por volta do século XVI. O ZEBRO sobreviveu apenas o suficiente para emprestar o nome aos animais listrados que os portugueses viram nas estepes africanas na época dos Descobrimentos.

Há quem defenda que o ZEBRO era o “Equus Hydruntinus”, um equídeo pré-histórico europeu que poderia ter sobrevivido em algumas regiões de Portugal e no Sul de Espanha até ao século XVI e que se pensava estar extinto desde há cerca de 12 mil anos. Têm sido encontradas algumas evidências da presença deste animal do Paleolítico em sítios arqueológicos do Neolítico (há cerca de 7 mil anos) e da Idade do Bronze (há cerca de 4 mil anos) que vem dar alguma consistência a esta teoria da sobrevivência do ZEBRO ou burro selvagem até à Época Moderna.

Na Idade Média consumia-se carnes de animais hoje inexistentes ou pouco consumidos caçados nos matos e florestas. Um deles era o Zebro, o burro selvagem. Os direitos cobrados pelos senhores sobre a caça desta animal limitava-se às peles vendidas mas a sua carne seria também apreciada pelos camponeses, como o javali, o veado e o gamo.

A desflorestação iniciada a grande ritmo a partir do século XII com a crescente ocupação humana do espaço, provocou o desaparecimento destes animais selvagens de grande porte e mais perigosos que tinham como refúgio os matagais e as florestas. No entanto, em algumas aldeias do Interior mantiveram-se costumes ainda relacionados com os animais já desaparecidos. É o caso das aldeias do concelho de Pinhel como o Manigoto e as Lameiras onde se preservou o costume de comer carne de burro, do doméstico porque o selvagem extinguiu-se há cerca de 400 anos. Nessas aldeias o burro era sacrificado por ocasião de festividades populares e consumido por todos os habitantes num grande banquete público que nos fazem lembrar os grandes banquetes colectivos realizados pelos Lusitanos e descritos por Estrabão na época da conquista romana da Península. Práticas actualmente proibidas para evitar a extinção do burro doméstico como aconteceu com o seu primo selvagem.

Por: Manuel Sabino Perestrelo

*perestrelo10@mail.pt

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