No último domingo, o Jarmelo esteve em festa. Para além da tradicional feira, os criadores e defensores da vaca jarmelista tiveram mais motivos para comemorar graças à assinatura do protocolo que vai certificar a raça. Na XXI ª Feira Concurso do Jarmelo, no concelho da Guarda, todas as vacas jarmelistas foram vencedoras, pois este acordo de colaboração vai assegurar a preservação e a certificação da espécie. Mas como nem tudo acaba sempre bem, a feira foi ensombrada pelos protestos de alguns criadores descontentes com os prémios atribuídos no concurso.
É o caso de Luís Capelo Matos, da aldeia dos Gagos, que ficou «muito insatisfeito» com o segundo prémio que arrecadou por considerar que devia «merecer» o primeiro. Para este criador, «o Ministério da Agricultura devia ter pessoas competentes para saber escolher um animal», lamenta, acrescentando que o júri «misturou “alhos com bugalhos”». Apesar de ter recebido dois prémios, um na categoria de vacas e outro de novilhos, Luís Capelo Matos não se conforma e garante que tudo não passou de uma «injustiça, pois atribuíram o primeiro prémio a um animal que não têm raça nenhuma», acusa. Para o secretário de Estado do Desenvolvimento Rural, Bianchi de Aguiar, «estes incidentes só dão mais valor ao concurso», porque demonstram «a importância deste património regional». Contudo, o governante sublinha que «em tempos de vacas magras, o apoio a esta raça não tem sido o desejado». Um lapso que este protocolo, que pretende certificar a raça jarmelista, pretende colmatar, pois «é um passo importante para valorizar estas raças locais», refere Bianchi de Aguiar, para quem o registo genealógico vai dar uma «maior visibilidade à jarmelista». O secretário de Estado confia, portanto, que a raça já esteja «enquadrada» ao fim de dois anos, o que vai permitir aos criadores utilizar «novos direitos para as raças autóctones».
Ao fim de algumas décadas de luta pelo estudo e certificação da jarmelista, os apelos dos defensores e criadores deram finalmente frutos. O protocolo, no valor de 10 mil euros, celebrado entre a Direcção-Geral de Veterinária e a Acriguarda – Associação de Criadores de Ruminantes da Guarda vai permitir a criação de um livro de registo genealógico das vacas jarmelistas. Numa primeira etapa vai ser estudada a identificação dos efectivos existentes na região e vai-se recorrer também à genética para apurar as características da raça, «através das ossadas de 400 anos que ainda temos», explica Agostinho da Silva, um dos elementos da organização da Feira do Jarmelo. A emoção que sentiu na assinatura do protocolo ficou a dever-se à «concretização de um desejo», explica o organizador. Em relação ao estudo, espera que se avance o «mais rapidamente possível», pois só assim se pode «evitar que mais crias sejam comidas como vitela de Lafões ou como posta mirandesa». O organizador descreve a vaca jarmelista como sendo «uma paixão», mas em termos físicos «é uma vaquinha com uma marrafa entre os chifres, amarelada, com bom porte e leiteira».
Apesar de ser a primeira etapa de um longo e moroso processo até à certificação, Agostinho da Silva está confiante que a jarmelista tem uma «quantidade significativa de exemplares que justificam a sua certificação», reforçando ainda que devem existir «cerca de 60 efectivos na região a “vestir de amarelo”». Contudo, o organizador está um pouco apreensivo em relação ao próximo ano, já que «não é fácil motivar os criadores», ainda para mais quando o apoio financeiro «é muito pouco». Na última edição, a organização distribuiu cerca de 6.000 euros em prémios, um valor que diminuiu este ano. «Entregámos muito menos, no máximo 4 mil euros», explica. Para além destas dificuldades, ainda há os desentendimentos que ocorreram no concurso, pois «todas as pessoas acham que merecem o primeiro lugar», lamenta Agostinho da Silva. Mas o júri escolheu de «uma forma criteriosa», ressalva, apesar de alguns criadores não concordarem. De resto, o certame reuniu os últimos produtores de jarmelistas, não tendo faltado também a música, as demonstrações de artes e ofícios tradicionais, bem como a tradicional garraiada.
Patrícia Correia