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A lei e a moral do Estado

O enorme aumento de rendimento dos gestores da Caixa Geral de Depósitos pode ser legal, mas não é moral. E é importante justificar por que razão a palavra certa é mesmo esta – moral. Se é compreensível, até recomendável, que o Estado e o espaço público em geral não imponham aos privados o que a Lei não impõe, o mesmo já não é válido quando o Estado age dentro da sua esfera. Aí, além da Lei, o Estado deve regular-se por uma ética pública. Aliás, à semelhança dos privados, que certamente terão, ou não, os seus princípios éticos, sobre os quais o Estado não deve fazer julgamentos. Mas se a sua voz deve ser unicamente a Lei, já a sua conduta, como a de qualquer outro agente, é determinada e avaliada além da Lei. Desde logo é escrutinada e avaliada por uma opinião pública e, em última análise, por eleições.

A CGD não é um banco qualquer. É o maior banco português, todos sabemos. Mas o relevante em matéria de ética pública é ser um banco de capitais públicos, liderado por gestores nomeados pelo Governo e assim comprometidos com a promoção do bem comum. Se o Governo argumenta que, para determinar o ordenado certo para António Domingues, novo presidente do banco, bastaria fazer a mediana com os bancos privados, então não procedeu bem, porque, pura e simplesmente, não é o caso de a CGD ser um banco privado. A fazer-se uma mediana, então que fosse feita com os bancos congéneres no espaço europeu, melhor, de Estados com PIB’s comparáveis ao nosso e com uma História recente de austeridade e sofrimento social. Sem esquecer aspetos certamente secundários dada a enorme remuneração em jogo, mas não menos relevantes do ponto de vista público, como poder juntar-se ao rendimento ordinário garantido de 423 mil euros outros 200 mil em prémios. Tudo isto a acumular com a outra nova condição do presidente da CGD – a de pensionistas de luxo do BPI. Nada é ilegal: legalmente, tudo é limpo. Mas moralmente, na aceção de uma moral de coerência de que também se faz a ética pública, o caso indigna. Por que não se lembra o Governo de fazer uma última mediana: desta condição tão legal de António Domingues com as tentativas de justificar a introdução de condição de recursos para as pensões mínimas, tão exíguas que até se pode dizer por extenso que anda na ordem dos duzentos e poucos euros?

Por: André Barata

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