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Por que motivo a Comissão Europeia não podia punir Portugal e Espanha

A Comissão Europeia propôs que as coimas previstas no Pacto de Estabilidade e Crescimento contra Portugal e Espanha fossem anuladas. Acérrimo defensor no Colégio desta solução, estou convicto de que tomámos uma decisão acertada, uma decisão que reforça a credibilidade das normas, a sua aplicação pela Comissão e, finalmente, da União Europeia.

De que se trata? Espanha e Portugal fazem face a um processo nunca utilizado até agora e que prevê, desde a crise financeira, coimas para os países da zona euro que não respeitem os seus compromissos orçamentais, ou seja, os países que não reduzam os seus défices orçamentais rapidamente e de forma bastante considerável. No caso de Espanha e Portugal, os números não deixavam qualquer dúvida: estavam longe de cumprir as regras orçamentais comuns. O Conselho dos Ministros das Finanças concordou por unanimidade com esta avaliação a 12 de julho. Na sequência desta decisão, que previa uma sanção aos dois países, a Comissão tinha 20 dias para propor as sanções financeiras a serem depois adotadas pelo Conselho, uma vez que são sempre os Estados-Membros que têm a última palavra.

Mas o procedimento automático não significa procedimento estúpido. As regras preveem a possibilidade da Comissão propor um montante inferior à referência prevista (0,2 % do PIB) e, eventualmente, anular as sanções se os Estados em causa apresentarem boas razões para justificar o passado e novos compromissos para o futuro. Neste caso, a Comissão decidiu anular essas possíveis sanções.

Era necessário impor uma multa à Espanha e a Portugal? Não creio. Ambos os países são pilares políticos da zona euro, sempre prontos a atuar pelo interesse coletivo. Os dois países passaram por programas de ajustamento económico, orçamental e financeiro muito dolorosos desde 2010, que deixaram vestígios ainda consideráveis nas sociedades portuguesa e espanhola. Ninguém pode afirmar que Espanha e Portugal não fizeram nada. Mas, sobretudo, ambos os países assumiram novos compromissos orçamentais sérios, sem dúvida, também devido à ameaça de sanção, revelando assim a sua eficácia.

Estou convicto de que a credibilidade das nossas regras não é a utilização da sua dimensão punitiva, mas sim os resultados que estas conferem por incentivos. Mais do que a punição, eu acredito na convicção. Em 2011, a maior parte dos países da zona euro registaram um défice excessivo — mais de 3 %. Hoje, a maioria está abaixo deste valor — com a exceção de quatro: Grécia, Espanha, Portugal e França. O défice médio da zona do euro é de cerca de 2 %. Esta é a melhor prova de que as nossas regras, finalmente, funcionam, não concordam?

Hoje, estou convencido que esta é uma vitória para as nossas regras, para a sua credibilidade e para a luta contra os défices. Finalmente, esta é a prova de que a União Europeia e a Comissão Europeia não são tecnocratas autistas, mas sim órgãos eficazes de coordenação das políticas económicas. Alguns, tanto à direita como à esquerda, pensam que as regras são demasiado complexas, imperfeitas, impossíveis de aplicar, escritas para um período que já terminou. Temos de estar abertos ao debate sobre estas regras. Necessitam de ser simples, politicamente legíveis e economicamente coerentes. Melhorias nesse sentido são evidentemente possíveis. O debate deve ter lugar. Estou pronto. Mas sem renúncia à credibilidade.

Por: Pierre Moscovici

* Comissário Europeu dos Assuntos Económicos e Financeiros, Fiscalidade e União Aduaneira

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