1. Não me suscita perplexidade os resultados eleitorais das últimas eleições para o Parlamento Europeu.
O elevado nível da abstenção verificado era de todo expectável.
Vivemos numa sociedade de caras fechadas, preocupados apenas com as circunstâncias de cada um, habituados a ver no que as coisas dão, sem grandes inquietações.
Construímos essa sociedade, garantida nos direitos, indiferente aos deveres, insensível aos valores.
É certo que a indiferença é sempre gratuita, inútil e cúmplice.
Mas temos de condescender, nunca nos inquietou a distância entre o mundo real e o mundo apregoado, entre a justiça reclamada e a justiça proclamada.
Toleramos bem a demagogia, a promessa fácil, o abuso a que conduzimos as palavras e não temos reparado no abismo que separa a vida prometida da vida sofrida.
A amorosidade é mesmo a característica mais evidente da nossa sociedade.
Neste contexto o que surpreende mesmo é a relativa estabilidade do quadro político partidário.
Os partidos políticos na sua generalidade já não despertam paixões que se não reconduzam a interesses pessoais ou de grupo.
2. Parece evidente, que os eleitores que se abstiveram, na sua maioria, entenderam que o castigo de uns era imerecido como prémio para outros.
Surpreende-me, por isso, que se impute à liderança atual do PS uma responsabilidade que manifestamente não tem no fraco resultado eleitoral do partido.
Há um evidente juízo de censura eleitoral nos partidos da coligação de Governo, pela dureza das medidas sociais e económicas impostas, mas existe também um juízo de reprovação pela irresponsabilidade do último Governo socialista que nos conduziu a esta situação.
Enquanto o PS não ajustar contas e apurar responsabilidades com o seu passado recente, enquanto não se definir com clareza, será indiferente que seja Seguro ou Costa a liderar o partido.
3. As recentes eleições para os órgãos distritais do PSD demonstraram uma peculiar vivacidade e um elevado grau de profissionalismo das campanhas que se confrontaram.
A vitória de Carlos Peixoto não faz desmerecer o resultado de Rui Ventura.
Ambos são jovens lideres que venceram pelo exemplo.
Porque a grandeza não está em demonstrar como deveriam ter sido ganhas as batalhas perdidas, mas em não lhes fugir.
O momento da grandeza é o da decisão.
Um partido que tem construído lideranças em combates abertos, de resultados sempre incertos, com protagonistas qualificados, é um partido vivo, que demonstra ambição, vontade e querer.
Os órgãos distritais agora eleitos têm inegáveis responsabilidades políticas emergentes, que lhes advêm do exercício do poder no Governo e na capital do distrito.
Serão tempos exigentes.
Há razões evidentes de inquietação na nossa sociedade, pelos sinais intensos de preocupante aumento da exclusão social, do fosso mais acentuado entre ricos e pobres, da diminuição demográfica e das difíceis condições de sustentabilidade da nossa estrutura económica.
Entretanto, o impulso que os novos fundos europeus poderiam dar à nossa economia, verifica um inusitado atraso, pela inexplicável teimosia do aparelho socialista que no quadro da CIM parece querer fazer valer critérios políticos sobre competências técnicas afirmadas.
É um caminho perigoso para uma sociedade de vozes cansadas, de projetos esgotados e de sonhos gastos em décadas de oportunidades perdidas.
Já não há futuros fáceis!
Por: Júlio Sarmento