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A minha bola de cristal

Bilhete Postal

Hoje imagino José Sócrates a correr nas ruas de Bruxelas como deputado europeu. Estamos no ano de 2016 e Passos Coelho está a estudar economia na Universidade de Londres onde a cadeira principal é a bancarrota de Portugal – “um estudo caso”. Passos surpreende os professores e colegas explicando como a austeridade conduziu a um défice maior, como a austeridade arrastou à perda de consumo interno, como as pessoas revoltadas, esfomeadas, o apedrejaram nas eleições de 2015. Ainda tem umas peladas na cabeça das arrochadas que uns «bandalhos dos sindicatos e comunistas» tiveram o desplante de lhe causar. Passos Coelho, levantado entre as cadeiras, esgrime os braços indignado. Fui traído pela “troika” – disse. «Eu cumpri, eu levei o plano além do que me pediam, mas os dados foram sempre falhando. As exportações eram maiores mas eram feitas pelo Amorim e o Pingo Doce e outros tipos que pagavam os impostos na Holanda. Não ficava lá nada do que ganhavam». Continuou, espantando a audiência: «As construtoras faliram porque eu continha o dinheiro, esticava nos pagamentos e quando chamava empresas elas já não respondiam. Eu fiz falir milhares de empresas ao não lhes pagar e não lhes abrir linhas de crédito». Os colegas de boca aberta, os professores surpresos!

A aula prosseguiu com análise aos dez mil milhões gastos pelo Governo para apoiar as falências bancárias. Portugal tem hoje barracas, tem de novo milhares de sem-abrigo. Portugal tem milhares de emigrantes e um parque automóvel miserável, uma necessidade de restauro das cidades quase ao nível dos bombardeamentos mais violentos. As fotos da demonstração do tema iam-se sucedendo. Os ex-primeiro-ministros de Portugal estão quase todos no exterior em cargos públicos ou privados. O mercado paralelo, a insolvência das famílias e das instituições, a ausência de manutenção, converteu as ruas em picadas e os jardins em zonas florestais perigosas. As fotos sucediam-se. Passos Coelho saiu da aula com todos a seguir-lhe os movimentos. Lá fora esperam-no alguns companheiros de percurso. Oh Relvas, nem aqui me largam!

Por: Diogo Cabrita

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