Nunca soube ao certo se “Soares é fixe”. Recordam-se que um dia meteu o socialismo na gaveta, percebendo hoje, com a provecta idade de quase 89 anos, há quem queira mete-lo, a ele, na gaveta. Sim, precisamente os mesmos que fazem questão de não se lembrar que Mário Soares foi o candidato oficial do PSD e de Cavaco Silva às eleições presidenciais de 13 de janeiro de 1991. Que com eles partilhou a ideia de dividir o movimento sindical, criando a UGT, verdadeira muleta negra de todos os governos de direita em Portugal. Que com eles distribuiu o poder, jobs for the boys, no bloco central, IX Governo constitucional (era então vice-primeiro o atual ministro dos negócios estrangeiros).
Mário Soares (re)aparece agora, como virgem imaculada, de discurso (quase) revolucionário e postura de um qualquer líder ideólogo manifestamente unificador das esquerdas. Lá diz o ditado “mais vale tarde que nunca”.
Enquanto colaborador do jornal “República” (página juvenil entre 1973 até 1975) estive com Soares no dia 19 de junho de 1975, aquando da célebre manifestação da Fonte Luminosa. Lembram-se da saída do jornal, a imposição de um diretor substituindo Raul Rego, por parte de Vasco Gonçalves e do MFA, do vergonhoso assalto à sede e a queda do IV Governo provisório, fazendo questão de não estar com Soares na fundação da UGT e quando foi candidato a Presidente da República em 1991. Nessa altura fui membro da Comissão Política Nacional e mandatário no círculo da Guarda da candidatura de Carlos Marques, não tendo tido Soares a postura correta quando, publicamente, se referiu à minha pessoa, enquanto militante do PS, no programa da falecida jornalista da RTP, Margarida Marante, “1ª página”, no frente a frente Mário Soares – Carlos Marques. Pesando os pratos da balança e embora concordante com todos os processos que visem destituir Cavaco, Passos e esta estúpida coligação, fiz questão de não estar presente na passada semana na Aula Magna da reitoria da Universidade de Lisboa.
O governo (tal qual as policias) ultrapassou todos os limites. É correto dizer e avisar que a violência pode estar a chegar. Que o governo é uma corja. Que os deputados tão bons uns como os outros e, aplicando o que escreveu Ramalho e Eça nas “Farpas” (janeiro e fevereiro de 1873), assenta a estes como uma luva «O governo é apenas o capitólio das mediocridades venturosas», percebendo-se que se alguma dignidade e verticalidade ainda sobra, o melhor era pedirem emprestado à Guiné a ilha das Galinhas, assumindo, com coragem, o suicídio político coletivo. Quanto ao primeiro-ministro não confiaria nele (por notória falta de competência) para ser presidente da Junta da União de Freguesias de Constatim e Vale de Nogueira. Uma última referência à centenária República, semi-parlamentar e semi-presidencial, feita de contrastes, onde se mistura o laicismo com uma sociedade maioritariamente católica, apostólica, percebendo-se que, afinal, ainda existe, mas está completamente órfã dado não existir timoneiro. Cavaco, efetivamente, não existe.
O aviso está feito. Portugal está transformado num autêntico barril de pólvora. Alguém já lhe colocou o rastilho. Oxalá ninguém se lembre de acender o fósforo.
Por: Albino Bárbara