Repentinamente, fez-se luz. É isso mesmo. A culpa de toda esta bagunça só pode ser da comunicação social. Sim, porque quem associou certas figuras públicas à pedofilia foi a comunicação social, não é?
Cartas anónimas incluídas em processos? Agentes da Justiça que passam informações para os jornais? Não, isso não tem nada a ver. A culpa por toda a situação que o país atravessa é, definitivamente, da comunicação social.
Foi, certamente, embalado por estas ideias que alguém aproveitou a confusão para alvitrar a necessidade de mudar a Lei de Imprensa, impedindo os jornalistas de fazer o que têm que fazer: informar.
Ora, meus caros, esta proposta é tão absurda quão absurdos são os argumentos usados pelos autores da proposta. Porque se o objectivo dos proponentes é moralizar a informação, então basta que se cumpram as leis existentes.
No que toca ao segredo de justiça, a lei é clara ao vincular todos os participantes no processo, sejam eles magistrados, funcionários judiciais, peritos, testemunhas, arguidos ou assistentes. Assim, qualquer fuga de informação remete para o Código Penal, pelo que não há nada para inventar. Aplique-se o que está escrito e o sistema melhorará de imediato.
Os crimes de abuso de liberdade de imprensa estão previstos na Lei da Imprensa. Para além da responsabilidade criminal imputável aos jornalistas, estão ainda previstas sanções para as empresas que, no limite, podem ver a sua publicação/emissão suspensa.
A tudo isto junta-se a fiscalização da Alta Autoridade para a Comunicação Social, organismo que tem poderes para suspender a actividade de órgãos de comunicação social. Verifica-se, pois, que existe legislação mais do que suficiente para regular o sector.
Pensava eu que toda esta polémica traria para a discussão o acesso à profissão de jornalista, mas tal não aconteceu. Porque, quanto a mim, uma das razões para a situação que se vive, é a forma fácil como se entra no jornalismo em Portugal. Basta provar que se exerce esta actividade como ocupação principal, permanente e remunerada há mais de dois anos, e aí está mais um jornalista na rua. Suspender temporariamente a actividade é igualmente fácil. Para se fazer publicidade ou desempenhar funções de assessoria de imprensa – duas actividades incompatíveis com a profissão de jornalista – basta entregar a carteira profissional no sindicato. Para regressar ao jornalismo é só levantar a carteira algum tempo depois. A simplicidade deste processo explica muita coisa e demonstra que é possível aceder à profissão sem qualquer tipo formação específica.
Na minha opinião, os candidatos a jornalistas deveriam ter um período de formação teórica e prática de quatro anos. Porque o jornalismo é uma profissão que envolve técnicas, é certo, mas também teorias, rotinas, princípios éticos e deontológicos que é preciso entender e, sobretudo, interiorizar.
Em suma, melhor comunicação social implica mais responsabilização dos agentes da justiça e mais formação na classe jornalística.
Por: João Canavilhas