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Guarda acompanha distrito e continua a perder habitantes

Concelho deixou de ser a exceção à regra numa região que perdeu 1.651 habitantes no último ano

A densidade populacional do concelho da Guarda atingiu em 2010 o valor mais baixo desde 2002 e, tendo perdido 173 habitantes no último ano, a tendência é para continuar a descer. Depois de, em 2001, ter sido caso único ao registar um saldo positivo em relação a 1991, a Guarda entrou no vermelho e acompanha agora as perdas já habituais nos municípios vizinhos.

Se compararmos os dados da densidade populacional de 1991 e 2010, a Guarda é novamente caso singular no distrito. Em 1991 tinha uma média de 54,7 habitantes por quilómetro quadrado, valor que subiu para 61,6 em 2010, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE). Este dado é próximo do de 2001 – 61,58 – mas encontra-se em queda desde 2006. Em termos distritais, Fornos de Algodres e Seia são os concelhos com perdas mais significativas em relação aos dados de 1991. O primeiro município apresentou em 2010 uma densidade populacional de 38,6 habitantes por quilómetro quadrado, com uma média de menos nove habitantes por quilómetro quadrado, atendendo aos 47,68 registados em 1991. Já Seia, apesar de ter o segundo valor mais alto do distrito 60,7 habitantes por quilómetro quadrado), está distante do alcançado no início dos anos 90, quando era o município com mais habitantes por quilómetro quadrado, com 69,8. Almeida e Figueira de Castelo Rodrigo, com perdas relevantes, continuam a ser os que têm menor densidade populacional, com 12,8 e 12,5 habitantes por quilómetro quadrado, respetivamente.

Em termos de variação populacional, o concelho da Guarda contrariou sempre a queda verificada na região Centro até 2005, mas desde 2006 que perde mais habitantes do que ganha. O problema afeta todo o distrito, que em 2011 perdeu 1.651 habitantes relativamente ao ano anterior, atendendo a dados do INE, sendo que todos os concelhos apresentam baixas em relação a 2010. Este fenómeno também se verifica no distrito de Castelo Branco, mas com mais alguma expressão, uma vez que “desapareceram” 1.844 residentes no mesmo período. Numa situação que não é estranha à realidade do interior, dados recentes do INE anteveem um problema ainda mais profundo. Em 2010 e, pela primeira vez nos últimos dezassete anos, o saldo migratório da Guarda foi negativo: no universo abrangido por migrações internas e para o estrangeiro, saíram mais dezanove migrantes do que os que entraram. Nesse mesmo ano, a taxa bruta de natalidade do município atingiu o nível mais baixo desde 1992 (6,8 nascimentos por mil pessoas), altura a que recuam os dados.

Na perspetiva de Pires Manso, economista e professor catedrático da Universidade da Beira Interior (UBI), esta situação vai continuar a agravar-se «pelo menos até 2030/2040», antecipando como um dos fatores o «saldo fisiológico que vai ser negativo» no distrito. Este crescimento negativo resultará em «cada vez menos impacto a nível nacional, em termos de população». A única possibilidade encontrada por Pires Manso e outros estudiosos da matéria é a imigração, com que a Guarda já chegou a «beneficiar», apontando esta solução não apenas aos próximos anos, mas sim às «próximas décadas». Contudo, a «condição essencial» para que isso aconteça é também um dos maiores problemas que a região enfrenta – a existência de emprego. «Se até os nossos jovens têm de emigrar para o litoral e para o estrangeiro, não há trabalho para os de fora», acrescenta o economista, que acredita não haver condições para fixar as pessoas.

O docente confronta esta problemática demográfica com uma economia que «está de rastos», pois as áreas que anteriormente atraíam trabalhadores para o interior também atravessam dificuldades. Os agricultores estão «envelhecidos», a pecuária «desapareceu praticamente», as florestas têm ardido «sistematicamente» e a indústria está «cada vez mais associada a poucas e pequenas unidades». Pires Manso apresenta ainda como exemplo a Plataforma Logística de Iniciativa Empresarial da Guarda que diz ter tido «um arranque lento e penoso», não conseguindo «o efeito esperado».

Nos Censos de 2001, o concelho da Guarda tinham mais 5.320 residentes do que em 1991, num total de 43.882. O economista justifica este crescimento «contra a corrente da região» com a abertura da Delphi e a «criação de 3.000 postos de trabalho». Assumindo que cada família tem, «em média, quatro pessoas», a chegada de novos trabalhadores foi importante no aumento da população. Deste modo, a Guarda e outros «concelhos urbanos, como Covilhã e Viseu, graças ao surgimento de algum emprego», foram a exceção à regra na zona Centro.

Valores de perda populacional são «alarmantes»

A queda demográfica do distrito vai agravar «as assimetrias regionais», arrastando-o para uma situação de «despovoamento e desregulação social e económica», considera Gonçalo Poeta Fernandes, coordenador da Unidade Técnico-Científica (UTC) da Escola Superior de Turismo e Hotelaria do IPG.

Esta «trajetória demográfica penalizadora» dos territórios com baixa densidade populacional, caraterística «desde os anos 50», poderá resultar «na completa desvitalização e no avanço da desertificação destes espaços condenando-os, em definitivo, a meras parcelas de território abandonado», acrescenta o atual vice-presidente do Politécnico da Guarda. Esta é uma realidade iminente no interior do país, sendo que «a ausência de verdadeiras políticas de desenvolvimento regional e o negligenciar de estratégias de valorização nos modelos de ordenamento propostos» vão ter efeitos já a curto prazo, avisa Gonçalo Poeta Fernandes.

Na sua opinião, os valores de perda populacional, em particular nos concelhos rurais, são «alarmantes» devido à diminuição de jovens e adultos em idade ativa. Os territórios de maior fragilidade revelam-se «incapazes de contrariar a tendência regressiva, caminhando para níveis populacionais que comprometem a sua sustentabilidade social e económica», acrescenta. A generalidade dos concelhos «perdeu mais de metade dos efetivos populacionais» que apresentava nos anos 50 e a perda «superior a dez por cento na última década» ameaça inexoravelmente o distrito da Guarda. Em 2010, a média da densidade populacional do país era de 115,4 habitantes por quilómetro quadrado, bem distante do alcançado pela Guarda (61,6), o concelho do distrito com valor mais alto.

Comentários dos nossos leitores
antonio vasco s. da silva vascosil@live.com.pt
Comentário:
Não está tudo dito, o problema vem mais do fundo, além destes que aqui e muito bem fala. Não esquecer que se não tivermos uma política de incentivo à natalidade isto não vai melhorar, até porque a política existente é contra o nascimento e é apoiada com dinheiros do contribuinte. O resto não só tem a ver com tudo isso que nos apresenta, mas também com a falta de imaginação do poder local, com a preocupação de preencher os seus lugares sem conseguir atrair investimento para a cidade dos f’s. Temos que conseguir dar a volta a tudo isto se apostarmos cada vez mais nas escolas, se ensinarmos as nossas crianças que devemos ser bairristas. Temos muito para crescer e temos capacidade. Esta receita que nos descreve não pode trazer à Guarda ainda mais negativismos e falta de esperança. Se em parte é uma realidade, compete a todos dar a volta por cima, (…), a Guarda não pode viver na sua maioria como cidade de serviços, a viragem é possível e temos capacidade para isso. Este interior não pode ser usado como desculpa, se antes se falava que não tínhamos uma estrada em condições, hoje temos, embora a pagar, mas temos. Temos a linha férrea que, no meu entender, devia ser em duplicado, pois isto tambem não nos ajuda. Não podemos meter a cabeça na areia e cruzar os braços, temos muito para crescer, temos condições, só temos de conseguir atrair investimento através de medidas de incentivo fiscal. A aposta passa pela cultura, turismo, gastronomia, desporto e lutar por uma região, pois a política deste Governo não nos ajuda.
 

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