A Guarda associou-se no passado sábado à manifestação contra a “troika” e cerca de um milhar de pessoas responderam à chamada, numa ação de protesto sem paralelo nas últimas décadas.
A praça encheu-se de tarjas e cartazes com frases como “fora a ‘troika’”, “queremos um novo governo” ou “basta de austeridade” e, durante cerca de uma hora, sucederam-se as intervenções de populares, relatando a influência da austeridade na vida das pessoas, em particular junto das gerações mais jovens e dos reformados. Contudo, além dos ataques à austeridade, à “troika” e ao governo de Pedro Passos Coelho, os manifestantes aproveitaram também a ocasião para protestar contra Ana Manso devido à paragem das obras do novo hospital gritando slogans como “Queremos o novo hospital” e “Manso igual à ‘troika’”. A manifestação seguiu pela ruas do Comércio e Alves Roçadas até ao Jardim José de Lemos, sempre com palavras de ordem contra o Governo, tendo os populares desmobilizado cerca de hora e meia depois do seu início sem incidentes.
Para cada cidade foi criada uma página no Facebook e, no caso da Guarda, contava na manhã de sábado com 13.600 pessoas convidadas, das quais 1.159 responderam afirmativamente. O facto do número de participantes se ter aproximado dessa cifra levou Miguel Ribeiro, um dos organizadores locais da ação, a considerar que foram «excedidas as expectativas». «Somos uma cidade tradicionalmente pacífica e com pouca tendência para a mobilização popular, mas hoje mostrámos a nossa força», considerou, lembrando que «a Guarda já está no interior esquecido e se nada for feito para mostrar que existimos, ainda mais esquecido fica». Miguel Ribeiro diz, por isso, que «é preciso mostrar que estamos vivos e que temos muitas razões de queixa», sendo esse um dos objetivos que o levou a promover este movimento popular na cidade.
O organizador confessa que «não esperava tanta gente» e que «não se lembra de assistir a uma mobilização destas» na Guarda. «É uma prova do descontentamento popular, um sinal que a situação atingiu um limite e é impossível continuar por este caminho», considerou o jovem, sublinhando que «o Governo tem caído com medidas de austeridade sobre aqueles que têm mais dificuldades, e as pessoas estão a ficar sufocadas». Miguel Ribeiro espera agora que este «sentido de mobilização cívica não se perca» e que o protesto funcione como «empurrão» para muitos outros, «em que os guardenses façam ouvir a sua voz em vez de ficarem calados no sofá e deixar que alguém decida por eles em assuntos que os afetam diretamente. É preciso continuar a lutar», apelou.
A ação tinha como lema “Que se Lixe a Troika! Queremos as Nossas Vidas!” e foi promovida através das redes sociais com o propósito de «unir os portugueses para dizer basta às medidas de austeridade» de forma «pacífica, espontânea e sem ligações a partidos ou sindicatos», de acordo com a organização.
Testemunhos
Porque participou?
Bruno Tavares
«Sou jovem e vejo o Governo a hipotecar a minha geração com as medidas que toma. Tenho estudos superiores, estou no desemprego e não há medidas para combater este flagelo social que é a falta de emprego entre os jovens qualificados. Emigrar é uma opção, mas deve partir da vontade de cada um e não ser imposta. Acredito que é possível construir um futuro neste país, mas não se continuar a ser governado desta forma. Por isso temos de sair à rua e mostrar o nosso descontentamento».
Fátima Santos
«É chegada a hora do povo se fazer ouvir e quero juntar a minha voz aos protestos. Trabalhei durante toda a minha vida para agora me oferecerem uma reforma miserável, enquanto outros ocupam um cargo durante meia dúzia de anos e ficam a receber milhares. E agora, para cobrir esses e outros gastos, voltaram a cair em cima de quem tem menos posses. Pouco a pouco, estamos a voltar ao antigamente, sem classe média e com grande parte da população a viver na pobreza. Não é este o país que quero».
Paulo Silva
«A “troika” está a destruir o país. Esses senhores deviam exigir sacrifícios e cortes aos políticos e aos mais ricos. Agora, se só cá vêm para pedir resultados, não os queremos cá. Claro que o governo, perante as metas que tem de cumprir, “espreme” os pobres, pois como alguém disse uma vez “são muitos e já estão habituados”. Deviam cortar nas regalias de quem já tem muito, mas isso não fazem. Sou o único que tem emprego no meu agregado familiar e agora ainda me vão tirar um salário por ano. Já o meu patrão vai pagar menos ao Estado. Não é justo e é por isso que estou aqui a protestar».
Fábio Gomes