Bem sei que passaram já duas semanas sobre os acontecimentos. Apesar disso, não posso deixar de os referir ainda que a esta distância. A gravidade que, pelo menos para mim, assumem justifica-o.
Refiro-me à estratégia de uma empresa “portuguesinha da silva” que não encontrou melhor forma de se promover do que aproveitar o Dia do Trabalhador para lançar uma iniciativa única até então. Sim que isto de comemorar o Dia do Trabalhador sem ser com trabalho, muito trabalho, não pode ser!… Vai daí, os crânios da publicidade, do marketing, ou do que quer que seja, pariram esta ideia de pôr todos a trabalhar até à exaustão. Que lhes pagaram bem dizem. A duzentos, trezentos ou até quinhentos por cento.
Vejam bem como são uns queridos estes patrões…
Vejam bem como eles zelam pelo bem-estar dos seus colaboradores como agora é moda dizer-se…
Vejam bem que até lhes pagam principescamente saindo o pilim das suas carteiras…
Uns verdadeiros, autênticos, genuínos, benfeitores estes patrões!…
O que me escapa, não entendo (ou será que prefiro nem entender?…) é por que ponderosas razões não decidiram eles aumentar o salário terceiro-mundista que lhes pagam… Ou será que é assim mais fácil pôr-lhes o jugo recorrendo à estratégia de lhes creditar mais uns pozitos, medidos em cêntimos, na magreza do seu ordenado mensal?… É que, reza a História, é incomensuravelmente mais fácil subjugar aqueles que sentem na pele, e no estômago, a fome, sua e dos seus. Mas, diz-nos também a História, que é também nestes contextos que se geram revoluções contra os nababos que impõem o capital acima de todos os valores, de todos os ideais. Afinal Chicago foi ontem apenas e o 1º de maio aparece, metodicamente, todos os anos…
A outra face da moeda foi dada pela resposta de uns largos milhares que anteciparam Fátima e, ala que se faz tarde, para novos santuários em procissão. Nada pacífica por sinal!… Não os condeno, que isto de encher a despensa a metade do preço quando os bolsos andam vazios não é para todos os dias. No entanto, vejam-se as imagens e pense-se naquilo que transmitimos para os nossos parceiros de uma Europa cada vez mais frágil, é certo, mas que, pelo menos até agora, ainda não caiu tão baixo como nós caímos desta vez…
Empurrões, murros, tudo valeu para conseguir o “prémio” de um desconto!… Se a tudo isto somarmos as condições de segurança que não foram acauteladas, então tivemos uma situação explosiva que só não descambou em tragédia porque ninguém ateou um rastilho. Mas isso, para quem olha para a carteira, não é mais que um punhado de amendoins com valor residual nas suas contas.
E é assim que o povo que deu novos mundos ao mundo vai agora dando mais este exemplo de como descobrir o último recanto, não do mundo mas da prateleira que ainda ninguém viu…
Apetece dizer, a propósito destas ações de promoção e dos seus autores como António Aleixo que tão bem filosofava:
Sei que pareço um ladrão
Mas há muitos que eu conheço
Que sem parecer aquilo que são
São aquilo que eu pareço.
P.S.: Quando miúdo, em dia que alguém, alguma família, queria comemorar deitava rebuçados “à rebatina”. Normalmente deitava-os das escadas da igreja e os catraios empurravam-se para tentar apanhar o maior número possível. Mas isso era um jogo… Ou seria o antecipar da ideia de dar o bodo aos pobres?…
Por: Norberto Gonçalves