Publicamos na presente edição uma grande entrevista a uma das mais extraordinárias personalidades portuguesas do nosso tempo e que, por fortuna ou acaso, é natural da nossa região: Eduardo Lourenço. Mais do que uma entrevista foi uma conversa, uma aula onde o mestre nos levou pelo mundo, pela história, pela filosofia, pela literatura e pela poesia, pela sua infância e pela sua errância…
Uma entrevista que começa pelo princípio, pelo mundo maravilhoso da infância, quando a criança que brincava feliz no pequeno universo de São Pedro de Rio Seco, uma pequena e pobre aldeia de riba-côa, ainda não sonhava que viria a tornar-se num dos mais esclarecidos e reconhecidos pensadores portugueses contemporâneos – «Sem mitificar a infância, o que, aliás, seria justo e natural, foi um tempo despreocupado, todo entregue à brincadeira, irresponsável. E depois veio a entrada na escola, onde fui um menino aplicado», recordou o ensaísta. A entrevista pode lê-la aqui e vê-la na íntegra em ointerior.tv, mas a conversa, em que atravessámos o tempo, de 1924 a 2011, essa fica connosco, na nossa memória, como um momento inolvidável de conhecimento e aprendizagem, de vivência e partilha, de afetos e saber.
De São Pedro do Rio Seco à Guarda, «que era como se fosse Nova Iorque» nessa descoberta para além do pequeno mundo da sua aldeia, de Lisboa à Coimbra dos anos 40, da geração neo-realista, ou às universidades francesas onde foi leitor de Português e estudioso da cultura ibérica e onde viveu as grandes discussões ideológicas do pós-guerra, ou o regresso a um Portugal de onde nunca partiu, mas a que não pensa regressar. Esta conversa tenta seguir o percurso da sua errância. A geográfica e essencialmente a do seu ensaísmo. A do pensamento que navega entre as fronteiras de múltiplas disciplinas sem procurar refúgio nas águas seguras dos saberes estabelecidos.
De tarde, o ensaísta foi merecidamente homenageado na “sua” pequena aldeia – «foi aqui que fiz a 4ª classe, embora tenha feito a 3ª na Guarda. Os primeiros dez anos da minha vida foram passados nesta aldeia, muito pobre, muito representativa do nosso atraso, no sentido civilizacional do termo. Não havia água nem eletricidade. A água só foi posta na primeira presidência de Mário Soares, a eletricidade pouco antes. Havia uma grande diferença entre S. Pedro e qualquer aldeia do outro lado da fronteira. Íamos lá fazer compras e já nos anos trinta tinham eletricidade: quase 50 anos de diferença. E aquilo era o faroeste deles.». E foi ali que recebeu os aplausos dos muitos e mui distintos que não quiseram faltar a tão elevado momento. E foi bom estar ali, com Guilherme de Oliveira Martins, Manuel António Pina, Gomes Canotilho, Pilar del Rio, Isabel Alçada, Ana Paula Laborinho, Rui Vilar, Mariano Gago, Marçal Grilo, Germano Silva… Luís Queirós, A. J. Dias de Almeida, J. M. Mota da Romana, Américo Rodrigues, Pedro Dias de Almeida, Maria do Carmo Borges, Joaquim Valente, António Batista Ribeiro, Vergílio Bento, entre outros, tantos outros… para aplaudir Eduardo Lourenço, a sua simplicidade, a sua cultura, a sua intelectualidade. Ou, como disse Guilherme de Oliveira Martins, para aplaudir «a consciência da Europa». Obrigado professor!
Luis Baptista-Martins