“Quem gosta de ler tem nas mãos as chaves do mundo.” (Rubem Alves)
1.No sábado passado (30 de Abril) acompanhei na Guarda a fase distrital do Concurso Nacional de Leitura, destinado aos jovens do 3º Ciclo e do Ensino Secundário e que pretende pôr em confronto os jovens estudantes a partir de leituras feitas, nomeadamente de literatura “tout court”. Para além da verificação de leitura, o exercício era também criativo (criação de uma quadra, leitura expressiva e comentário a uma frase do livro em causa), abrangendo escrita e oralidade, com provas públicas. Pelo meio, a camaradagem e a música como elo de ligação. Passou-se um dia entretido à volta dos livros. E muitas outras atividades seriam possíveis para “animar” a leitura, como pretende o Plano Nacional de Leitura.
2.Os eventos que evidenciam o prazer de ler e fazem da leitura uma festa levam alguns a torcer o nariz por acharem que a leitura deve ser mais concentração e menos foguetório, mais quarto tranquilo e menos sala de discussão. No entanto, as duas visões têm o seu lugar, satisfazendo os dois lados da leitura: a procura de um imaginário que satisfaça o “eu” e venha de encontro aos seus sonhos ou fantasmas e a transformação do livro em objeto de comunhão e transformação. A leitura nasce do isolamento mas não cresce se não se confrontar com os outros leitores. Sendo primeiro espaços privilegiados de descanso e sistematização das ideias e das histórias, os livros, depois de colocados na mesa redonda da conversa, transformam-se em espaço de transformação e enriquecimento mútuo. E depois do cruzar de leituras, o repouso da solidão poderá dar lugar a outra leitura individual, uma terceira leitura.
Assim surgiram ao longo das últimas décadas os Clubes de Leitura ou Comunidades de Leitores, com mais ou menos felicidade, com maior ou menor continuidade, com êxitos rotundos ou medianias dececionantes. Nos Clubes de Leitura que conheci as experiências foram quase sempre de vocação temporária, temporadas de dois ou três anos após os quais o Clube morreu para depois renascer sob outra forma. E os temas ou os formatos de clube podem ser os mais variados, desde o clássico regime do debate até à inclusão de representações teatrais ou de recitais ou da comparação com os filmes respetivos. Muito caminho para fazer (re)nascer clubes de leitura, porventura com formas mais criativas. Depois de ver o “Clube dos Poetas Mortos”, quem não sonha em transformar a leitura em agente transformador das pessoas? Quem desdenhará criar ambientes de leitura que façam apelo ao que de mais belo há em nós?
Os exemplos de encontros à volta dos livros nas bibliotecas escolares, mas também em outros centros de cultura, podem ser infinitos conforme os géneros e os cruzamentos que pretendermos. Se não passamos sem a pessoa do autor, aí estão as apresentações de livros; se cruzarmos com a TV, os formatos de concursos são numerosos; se cruzarmos com o teatro, as adaptações serão um desafio; recitais de poesia e música podem dar origem a simbioses inesperadas; as diferentes capas de uma obra podem ser um bom ponto de partida para uma conversa; a criação de jogos, mesmo eletrónicos, à volta dos livros, não será menos estimulante.
3.Américo Rodrigues, diretor do Teatro Municipal da Guarda (TMG), recebeu a medalha de mérito cultural do Ministério da Cultura. É acontecimento nacional. A este homem que moldou ao longo do último quartel o panorama cultural da Guarda e as suas gerações cultas e se projetou para além da Guarda, aqui fica a homenagem, à persistência, à coragem de criar, à clarividência, às opções de programação variadas mas exigentes. Para além das polémicas, quase sempre de pouco fruto, as obras e a marca ficarão e são excecionais.
Por: Joaquim Igreja