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Chorar Sobre o Leite Derramado

Antes da nossa entrada no Euro, e na própria União Europeia, para o que interessa, havia sempre uma solução disponível sempre que a crise apertava mais: desvalorizava-se o Escudo, imprimindo mais dinheiro, e com isso aumentava-se a competitividade da nossa indústria e das nossas exportações. Os salários baixos dos portugueses e a baixa cotação do escudo tornavam os nossos produtos mais baratos e mais procurados. É claro que isto implicava condenar para sempre a salários baixos e à pobreza boa parte da nossa população, mas pelo menos havia trabalho e cá nos íamos “remediando”.

Quando entrámos no Euro deixámos de ter política monetária e os nossos produtos perderam rapidamente o atractivo do seu baixo preço. Ou eram melhores do que os outros, o que muitas vezes não acontecia, ou não se vendiam de todo, que havia quem fizesse (muito) mais barato – e assim entraram em falência as indústrias do têxtil, do calçado, das conservas, do vidro. Não admira que a nossa balança comercial rapidamente se tornasse deficitária, que começássemos a comprar mais ao estrangeiro do que vendíamos (e o défice dessa balança ultrapassa já dez por cento do PIB), o que implica, para equilibrar as contas, mais empréstimos e mais passivo – e é por isso que não funcionam as propostas “de esquerda” para resolver a crise, que passariam por aumentar o poder de compra dos portugueses para estes, comprando mais, darem um abanão positivo na economia e nas empresas portuguesas: isso só iria aumentar o défice comercial e as empresas beneficiárias seriam sobretudo chinesas, ou alemãs, ou espanholas.

Por isto chegámos ao ponto de descobrir que não só estamos numa crise económica sem precedentes, como concluímos que não dispomos já dos meios para a debelar. A solução estaria no Banco Central Europeu, que pode imprimir mais euros, assim desvalorizando a moeda comum e aumentando a competitividade das empresas da zona Euro – mas isso a Alemanha, que é quem verdadeiramente manda, não quer.

Aqui chegados, não nos vale a pena chorar sobre o leite derramado e as oportunidades perdidas. Nem nos adianta insultar os nossos políticos, que viram tudo isto chegar e nada fizeram, senão cuidar dos seus próprios interesses e dos interesses das infames manadas que os seguem. É pena que com as suas desastrosas políticas educativas tenham produzido gerações sucessivas de analfabetos, cada vez mais bisonhos, cada vez mais vulneráveis às mais vulgares burlas e que não percebem sequer que o leite está derramado – e isso é mau.

Por: António Ferreira

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