Foi com um «misto de comoção, emoção, mas, ao mesmo tempo, de vontade de partir para um novo projecto» que a corporação dos Bombeiros da Guarda se despediu do antigo quartel, na manhã do último domingo, dia da comemoração do 127º aniversário da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários Egitanenses. Um espaço «com muita história» que acolheu os “soldados da paz” durante mais de 20 anos, agora ultrapassado por uma «obra melhor e mais grandiosa», mas que deixa «saudade de todos nós nestas pedras, neste tecto, nestes homens, nesta gente». A Madeira Grilo, presidente da mesa da Assembleia, coube fechar a porta e dizer «adeus quartel velho», entregando a chave a Júlio Espigado, bombeiro do quadro honorário e membro da direcção, para quem aquele objecto será «uma verdadeira relíquia».
Depois do hastear e arrear das bandeiras no quartel velho, seguiu-se um desfile apeado e motorizado do corpo de bombeiros até à nova casa, situada na rotunda da Catraia da Alegria. Um quartel «com condições» que será recheado por um edifício humano «construído», disse Álvaro Guerreiro, presidente da direcção dos BVG, regozijado porque «há muitos anos não via uma formatura de aniversário com tanta gente como hoje». Dois pelotões encheram a parte frontal do edifício, além dos restantes membros que estavam de piquete e dos que preferiram ficar fora do alinhamento, para receber as várias entidades, entre as quais não figurou nenhum membro do Governo. Algo que não impediu Guerreiro de deixar recados, que certamente Duarte Caldeira, presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses e Joaquim Lacerda, Governador Civil da Guarda, se encarregarão de levar à tutela, afirmando que os bombeiros da Guarda «têm condições condignas» e que «estamos abertos ao diálogo com vista à localização neste espaço da sede do Centro Distrital de Operações de Socorro», actualmente a funcionar em instalações arrendadas. O objectivo é constituir na nova estrutura o «parque de segurança do concelho e do distrito», continuou o presidente, relembrando ainda que os bombeiros «exigem e as populações precisam de um piquete permanente», além de ser necessário «encarar a renovação» do material que tem sofrido um desgaste «extraordinário», sobretudo as viaturas.
Tudo se conjuga para que o novo quartel, que «tem muito boas condições», continue a ser bem conotado em comparação com outros «até no estrangeiro», disse Guerreiro, relembrando a benfeitoria do Programa Polis que, há três anos, permitiu protocolar a construção da nova infraestrutura, como “moeda de troca” pelo antigo quartel e espaço envolvente, onde vai nascer uma zona de recreio. A obra custou dois milhões de euros, um esforço financeiro suportado pela sociedade PolisGuarda, que permitiu a construção do novo «templo» dos BVG, onde terão o «mesmo brio, disciplina e espírito de serviço, honrando a farda e o lema dos bombeiros portugueses». Todavia, o «templo», como o designou Guerreiro, ainda não está completamente equipado, pelo que a corporação vai continuar a campanha de angariação de fundos junto da população do concelho da Guarda, dado que mesmo com o subsídio do Ministério da Administração Interna de 67.500 euros, o montante ainda é insuficiente. Apesar do quartel já possuir algum equipamento operacional e algum mobiliário técnico, a verdade é que são necessários 150 mil euros para o mobilar na íntegra. Daí a direcção ter assumido a restante verba, «enjeitando acusações gratuitas e infundamentadas como aquela que nos foi feita (pela deputada Ana Manso) de que a falta de equipamento e de verba para o custear se ficou a dever a má gestão desta associação por atempadamente não termos outorgado um contrato-programa com o Governo», realçou Guerreiro, relembrando que «não temos notícia que se tenha agido diferentemente» na construção de outros quartéis. Ainda assim, o responsável, que recebeu a medalha de ouro da Associação Humanitária, disse que quando a tutela quiser «nós aceitamos a outorga desse contrato-programa na data que acharem mais conveniente».
«Casa da paz»
Embora a hora fosse de festa, na verdade a alegria dos bombeiros estava subjugada ao cansaço da última semana devido aos vários fogos que cercaram o concelho. Madeira Grilo disse mesmo que com a inauguração da «casa da paz», havia que «sair das cinzas e pensar num futuro mais risonho», até porque os bombeiros de Portugal, o exército «mais barato do país», foram postos «à prova» nas últimas três semanas, continuou Duarte Caldeira. O presidente da Liga dos Bombeiros fez um retrato nacional de apenas um dia de incêndios que envolveu mais de 16 mil “soldados da paz”, contrariando alguns números avançados «por ignorância ou má fé» que registavam só 3.300. Caldeira frisou ainda que «quando os bombeiros intervêm é porque tudo fracassou antes deles», desviando qualquer crítica ao «esforço sobre-humano dos voluntários».
Já Maria do Carmo Borges preferiu centrar-se na nova casa, referindo que é uma obra que «fazia falta não só aos bombeiros, como à Guarda», transmitindo ainda a mensagem deixada pelo Ministro do Ambiente de que «teremos que analisar o resto para termos uma casa com mais vontade de trabalhar». E relembrou que esta e a inauguração do quartel de Gonçalo, planeado para 2004, são «o futuro que a Guarda merece». Por último, Joaquim Lacerda salientou o trabalho dos bombeiros na última semana, no combate à «pior» vaga de incêndios de que «há memória» na Guarda.
Rita Lopes