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O PEC do Passos

Passos Coelho não gosta do Programa de Estabilidade e Crescimento proposto pelo PS a Bruxelas. Bruxelas também não, diga-se, assim como não gostaram o PC, o PP e o Bloco. Ninguém gostou, mas foi aprovado, com a cumplicidade tácita do PSD pré-Passos. Quanto ao Passos, apenas se sabe que não concorda com algumas medidas de austeridade e se prepara para as chumbar no parlamento, quando tiverem concretização legislativa, assim como não concorda que a redução do défice orçamental se faça à custa de privatizações. Terá toda a razão, mas convém que diga onde pretende poupar, para diminuir a despesa, e como pretende aumentar a receita.

De concreto, a oposição à esquerda parece assentar na necessidade de aumentar os impostos sobre o rendimento da Banca e na taxação das mais valias bolsistas, para além da recusa de medidas que impliquem diminuição de prestações sociais ou congelamentos de salários – baixar salários, nem pensar. Há que dizer que tem sentido fazer a banca pagar a mesma taxa de IRC aplicada às empresas industriais ou comerciais. Não há qualquer justificação ética para serem favorecidos e a ameaça, subliminar, de que os bancos iriam repercutir esse acréscimo de IRC no seu tarifário não é para ser levado demasiado a sério, que a Caixa Geral de Depósitos ainda é o maior banco português e é pública – podendo por isso corrigir através da oferta de serviços mais baratos o inflacionamento artificial dos preços da banca privada. É por isso muito má a velha ideia de Passos Coelho, que pelos vistos abandonou, de privatizar, mesmo que só parcialmente, a Caixa. É claro que há muitas outras razões para os bancos pagarem impostos tão baixos, pelo menos tantas quantos os ex-ministros que estão neste momento a ganhar milhões nos seus conselhos de administração. Ou esperam vir a estar.

O problema é que não chega, não basta aumentar a taxa de IRC da banca, mesmo que para 25%. Em 2009 esses lucros foram de 1,7 mil milhões de euros, o que representaria, a uma taxa de 25%, uma colecta máxima de 425 milhões de euros. Sabendo que o nosso défice orçamental é superior a 15.400 milhões de euros, é evidente que por aqui só resolvemos uma pequena parte – e há que não esquecer que os lucros gerados pela Caixa Geral de Depósitos, por ser pública, e por isso de todos nós, nem deveriam ser considerados nestas contas. E as mais valias bolsistas? Segundo o próprio Francisco Louçã não ultrapassariam cem milhões anuais. Assim, embora a esquerda tenha razão nestes impostos em concreto, nem que seja por uma questão de ética e de igualdade de distribuição de sacrifícios, faltam-lhe quase 15 mil milhões de receitas nas contas.

Que fazer? Passos dá-nos a resposta: “Não temos soluções mágicas”. Parece pouco, e é, mas pelo menos não embarcou em asneiras, como privatizar a Caixa, e as asneiras em que embarcou foram proferidas naquela bela voz de barítono impecavelmente colocada. Ainda o veremos como porta-voz de um banco.

Por: António Ferreira

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