Passado o tempo das cerejas, com as eleições europeias, surge a época dos santos, ditos populares, com sardinha assada e pimentos a gosto do freguês.
Só que, neste arraial a raia miúda não entra. Assiste, expectante, ao “forró dos caretos” do costume.
Confirmou-se que durante oito anos, entre 1999 e 2007, cinco membros do Conselho de Administração do BCP conseguiram esconder um esquema de manipulação de acções que, de acordo com a acusação do Ministério Público, causou um prejuízo de 600 milhões de euros ao banco. Cinco administradores do topo da hierarquia são acusados de manipulação de mercado, falsificação da contabilidade e burla qualificada.
A desvalorização dos títulos nunca foi devidamente contabilizada pelo BCP, que escondeu os prejuízos, razão pela qual, os ex-administradores podem vir a responder pelo crime de falsificação da contabilidade.
Só que, neste nosso querido Portugal, para alguns o crime compensa.
Ao esconderem os prejuízos, os cinco ex-responsáveis puderam receber 24 milhões de euros em prémios de gestão, e daí a acusação de burla.
Recorde-se que, no parlamento foi criada uma comissão de inquérito para apurar a verdade sobre o caso BCP. Mas muitas das perguntas ficaram sem resposta, porque os principais responsáveis pelas fraudes escudaram-se no segredo profissional ou de justiça para justificar o silêncio face ao parlamento. Bloco de Esquerda e PCP exigiram o levantamento do sigilo profissional mas PS e PSD opuseram-se, impedindo a investigação de ir até ao fim.
O processo teve início em Dezembro de 2007 e só agora, um ano e meio depois, foram deduzidas acusações.
Tempo demais!!!
E, para quando o julgamento?
Talvez para outros tempos de folias.
Acredita-se e credita-se nas contas da justiça mas mais e mais nas outras, dos paraísos fiscais, ilhas Cayman e off-shores. Os do costume, BCP, PPN e BPP!!!
Só que o País vai agonizando.
Ficou-se a saber que Portugal é o país da União Europeia onde a taxa de mortalidade das empresas é mais elevada. A vontade de ter um negócio próprio é grande, mas a realidade mostra que apenas 30% das empresas se mantém em actividade no fim do primeiro ano de vida.
Os números sobre a criação de novas empresas mostram que Portugal é o terceiro país da União Europeia com a mais elevada taxa de natalidade empresarial (14,2%), mas mostram igualmente que a taxa de mortalidade (encerramentos) é a mais alta (14,8%), por comparação com a realidade dos 18 estados-membros para os quais existem dados semelhantes.
Os dados do Instituto Nacional de Estatística confirmam a fragilidade estrutural da nossa economia e, nalguns casos, o parasitismo e oportunismo de muitos que olham mais para os apoios e menos para consecução das práticas empresariais.
A crise não explica tudo!!
As desigualdades sociais determinam que se ocupe a cauda da tabela europeia de bem-estar infantil. Vergonha nacional!
Portugal ocupa os últimos lugares entre os países europeus, relativamente ao bem-estar infantil. Em termos de Educação somos mesmo a terceira pior nação. Os apoios apenas conseguem eliminar 5% da pobreza infantil que era de 21% em 2006. Segundo o estudo que utiliza dados oficiais da União Europeia, a pobreza atinge mais os jovens entre os 0 e os 17 anos do que a população em geral.
O estudo indica que, em 2006, ainda antes de entrar em cena a crise económica que actualmente atravessamos, existiam 21% de crianças a viver abaixo do limiar da pobreza – em lares com menos de 60% do rendimento médio nacional, mesmo após a obtenção de apoios e subsídios.
Ainda de acordo com os dados do trabalho, perto de um terço das crianças portuguesas habita em lares com falta de bens consumíveis e 39% vivem com constrangimentos financeiros.
A isto chama-se convergir? Convergir com países do oitavo mundo?
Mas, se a nível nacional o descalabro social é o conhecido, que dizer dos números assustadores do aumento das famílias carenciadas no distrito da Guarda?
Segundo dados publicados pela comunicação social regional, verificou-se um aumento de 16% no número de famílias a receberem o Rendimento Social de Inserção (RSI) no nosso distrito. O número de pessoas a recorrer à Caritas Diocesana da Guarda, à procura de alimentação, roupa e ajuda financeira, duplicou desde Novembro do ano passado.
A situação é de tal ordem que, a manter-se esta tendência, a instituição poderá não conseguir dar resposta a todas as solicitações e esgotar os seus recursos.
A Guarda aparece como um dos casos mais preocupantes a nível nacional, registando das mais graves situações de pobreza.
A explicação para estes números estará no desemprego que atinge muitas famílias na região.
Esta é a realidade social que alguns pretendem escamotear.
Nela se inclui, obviamente, um poder local que tem miragens, que se deveria comprometer com o desenvolvimento de toda uma população, forja na economia doméstica “virtuosas” dívidas de milhões de euros.
Esta dissimulada economia doméstica, completamente falida e incoerente, “virtuosamente” estéril, escandalosa na sabotagem dos sonhos de vida e de futuro de um povo e de um concelho.
Uma classe política que constrói castelos de cartas com a vinda de secretários, secretárias das secretárias e até um primeiro-ministro que perde tempo a «colocar» uma pedra, num hospital que de remendo em remendo, já se não reconhece o pano original.
Não o prazer, não a glória, não o poder: a liberdade, unicamente a liberdade, in Livro do Desassossego, de Fernando Pessoa.
Por: Jorge Noutel *
* Deputado do Bloco de Esquerda na Assembleia Municipal da Guarda.