Adeus, Aristóteles. Olá, Newton

Escrito por António Costa

“A mecânica newtoniana cresceu e foi divulgada durante mais de um século, pois ainda que o seu criador tenha estabelecido as ideias físicas essenciais no fim do século XVII, os métodos matemáticos necessários para as desenvolver foram aperfeiçoados ao longo do século XVIII e princípio do século XIX. “

Newton, que derramou o seu extraordinário talento em áreas tão díspares como filosofia natural, mecânica racional, cálculo infinitesimal, geometria, ótica, alquimia e estudos bíblicos, estabeleceu as três leis do movimento da mecânica clássica, juntamente com a lei da gravitação universal, que identifica com o nome de gravidade, ou gravitação, a atração que existe entre todos os objetos do Universo.
Foi o primeiro cientista que começou a utilizar a palavra “força” no sentido moderno – ou quase – de “interação”, isto é, como uma influência que uns corpos exercem sobre outros, responsável por alterar alguma característica física, neste caso, o estado de movimento ou de repouso. A lei newtoniana da gravidade diz-nos que a força de atração entre dois corpos do Universo é diretamente proporcional ao produto das suas massas – uma medida da quantidade de matéria que contém – e inversamente proporcional ao quadrado da distância que os separa. Como a gravidade enfraquece desta maneira curiosa, Newton demonstrou que as órbitas dos objetos celestes deviam corresponder a um tipo de curvas chamado “cónicas”, entre as quais estava a elipse, tal como Kepler descobrira.
O avanço genuinamente revolucionário de Newton – superior às suas proezas científicas concretas, todas elas fantásticas – consistiu na unificação dos mundos terrestre e celeste, que o aristotelismo mantivera rigidamente separados. Kepler desvendara alguns aspetos do movimento dos corpos na superfície terrestre. Mas foi Newton que demonstrou que as suas leis do movimento funcionavam tanto para a Lua na sua órbita como para a maçã a cair do ramo de uma árvore. O Universo era, como a própria palavra indica, uma unidade submetida às mesmas leis naturais em toda a parte. O mundo físico não era composto por compartimentos estanques.
A mecânica newtoniana cresceu e foi divulgada durante mais de um século, pois ainda que o seu criador tenha estabelecido as ideias físicas essenciais no fim do século XVII, os métodos matemáticos necessários para as desenvolver foram aperfeiçoados ao longo do século XVIII e princípio do século XIX. Foram talentos do calibre de Euler, da família Bernoulli, de D’Albert, Clairaut, Cauchy ou Laplace que conduziram a mecânica de Newton ao seu esplendor máximo. Foi nesta época que, à semelhança da conservação da matéria, foram propostas as primeiras versões de leis sobre a conservação do momento linear (a massa de um corpo multiplicada pela sua velocidade) e do momento angular (uma grandeza geralmente associada às rotações).
Ao mesmo tempo consolidava-se uma visão da natureza – a chamada “visão newtoniana” – que considerava todos os corpos materiais formados por partículas microscópicas que se atraíam ou repeliam mutuamente mediante forças à distância semelhantes à gravitação. O programa básico da ciência newtoniana orientava os seus esforços para a pesquisa deste tipo de leis dependentes do quadrado da distância.
A descoberta realizada pelo francês Charles-Augustin de Coulomb da força entre cargas elétricas em repouso, ou força eletrostática, pareceu confirmar essa interpretação do mundo físico. Os fenómenos elétricos e magnéticos eram conhecidos pelo menos na Grécia clássica, mas ninguém até esse momento se dedicara a descrevê-los em termos matemáticos. O facto da lei eletrostática de Coulomb ser praticamente idêntica à gravitação Newtoniana – trocando “massas” por “cargas elétricas” – reforçou a convicção dos cientistas de que estavam no bom caminho.
O próprio Newton interrogara-se, em 1704, se existiam outras forças atrativas ou repulsivas, diferentes da gravidade, entre corpúsculos materiais demasiado pequenos para serem visíveis. O génio inglês procurou explicar, sem êxito, a combinação de substâncias naquilo a que hoje chamamos reações químicas. Mas a ideia foi expressa e o desafio foi abraçado por Roger Joseph Boscovich, um desconhecido clérigo ítalo-croata, naquela que seria possivelmente a primeira tentativa de unificar todas as forças naturais.

Sobre o autor

António Costa

Leave a Reply