No passado fim-de-semana, a propósito do encontro na Suíça entre alguns profissionais do entretenimento político e Volodomyr Zelensky, emitiram-se opiniões, produziram-se análises e alvitraram-se hipóteses. Uma delas, cuja popularidade não ultrapassa a sede do PCP e as páginas do “Público”, considera que ajudar a Ucrânia a defender o seu território é uma atitude belicista. No mesmo dia em que começava tal cimeira, um especialista em Relações Internacionais ocupava uma página inteira do excelso diário com a tese de que o Kremlin não tem interesse em mais territórios e está preocupado com a escalada nuclear. Aconselho a este camarada umas doses de Solovyov.
Segundo esta teoria, é escusado tentar defender a Ucrânia. Primeiro, porque vão perder de qualquer maneira. Segundo, porque não merecem ganhar. Terceiro, porque a NATO e a América é que são uma ameaça, não é o Kremlin putinista. É o mesmo tipo de tese defendida pelo general Pétain, na Segunda Guerra Mundial. Combater os nazis é escusado, oferecemos-lhes Paris, mas ainda ficamos com a Côte d’Azur.
O dia D, que ainda há duas semanas foi amplamente celebrado por marcar o início da libertação da Europa do Norte das ocupações pelo exército alemão, não deve ser celebrado por estas cabeças. Tanta gente que morreu a lutar contra os nazis, quando afinal se podia ter vivido em paz num III Reich do Cáucaso aos Pirinéus.
Estendendo este raciocínio a outras esferas, o futebol europeu deve ser, actualmente, um tormento para estas criaturas. Primeiro, porque em vez das gloriosas selecções da Jugoslávia, da Checoslováquia e a da URSS, andam para lá províncias como a Ucrânia e a Geórgia, a Croácia, a Sérvia e a Eslovénia, a República Checa e a Eslováquia. Por outro lado, a melhor equipa da RDA é um clube que foi comprado pela Red Bull.
Se déssemos por boas as intenções de Hitler como estes comentadores dão a Putin, o grupo D do Euro 2024, com França, Áustria, Holanda e Polónia, seria um torneio de regiões. E mesmo o próprio jogo, de acordo com esta linha de pensamento, é questionável. Se algumas equipas já sabem que no fim não levam a taça, mesmo que comecem com uma vitória contra uma selecção mais forte, para quê o esforço? É uma utilização excessiva de recursos para no fim serem os franceses ou os alemães a ficarem com a taça. É um disparatado fomento da competitividade por uma bola, quando podem ficar no campo de treinos a brincar.
Entreguemos, portanto, a Ucrânia a um gémeo de Lukashenko, até porque, como se viu no jogo contra a Roménia, aquilo é gente que defende muito mal.
* O autor escreve de acordo com a antiga ortografia