Quando, empenhadamente, estudamos História de Portugal avantaja-se-nos o sentimento da incultura que enforma o País como causa primeira – e avassaladora – dos ingentes males que a Grei padece.
Como sempre acontece, saliento que não se trata de aduzir uma lamúria, de qualquer tipo de lamúria, antes de que nenhum progresso é possível sem nos conhecermos enquanto entidade colectiva. Mais. Afirmo sempre – ademais com crescente convicção – que a Abundância não tem limites, ou seja, que depende apenas de nós, da nossa dignidade e esforço.
Aliás, o génio de Smith já o afirmara: a prosperidade é um efeito da identidade intrínseca do homem, não do dinheiro que lhe venha de transacções com o exterior (mercantilismo), do território que se possui (fisiocracia) ou da expansão além-mar (que pode ser colonialismo). Sobre isto um extenso discurso se propiciaria – mas não há espaço.
Claro que o conhecimento da identidade colectiva não é possível sem o conhecimento de nós próprios – e o conhecimento de nós próprios não é possível sem o tal empenho, dedicação, amor. Melhor. O conhecimento exige que nos sintamos elemento da colectividade. Mas elemento solidário, portanto activo, participante, qualificado.
Se o Passado é, ipso facto, obrigatório, a apurada atenção ao Presente e o vislumbre do Porvir são igualmente um postulado.
O que se nos depara, desde o início do século XIX, é uma debilidade profunda ao nível do agir – salvo com Salazar. Mas Salazar estava demasiado traumatizado com o miserando “espectáculo” republicano, demasiado carregado de um catolicismo a-terreno, ademais de receoso de uma tão catastrófica experiência como o regime soviético. Assim, seguir com os seus propósitos era mais importante que o respeito pela pessoa. Mais. Em contra-reacção suscitou admiradores da França e admiradores do “Sol da Terra”. Salvo excepções, a Igreja pôs-se ao seu lado. Débil ou errado agir, visto que débil cultura.
(O lastimoso estado da URSS não deve, desde logo, ser interpretado com o que se revelou a partir de Gorbatchev – antes, isso sim, com os milhões de mortos às mãos de Estaline. E que a “decadência francesa” seja hoje um tópico debatido, isso só pode surpreender os de um certo ângulo, ou seja, aqueles que alguma vez puderam acreditar que os principios revolucionários de 1789 eram-em-si suficientes quanto bastasse.
De outro modo: o profundo respeito pela hierarquia e pelo passado, tão próprio da cultura e postura britânicas, e o “In God we trust” (“Confiamos em Deus”), que os americanos – eloquentemente – imprimem nas suas notas de banco, deviam, desde logo, avisar os que, em Portugal, têm pretensões de surgir como fautores de opinião. Por trás de tais posturas está o religioso, religioso que está igualmente por trás das mundividência e mundivivência alemãs).
Quando aqui afirmo o primado da religião não o equivalho a nenhum primado da confessionalidade. A religião, sim, lato sensu. A Ecologia, v.g., é, apenas, um dos seus epifenómenos – mesmo que crucial.
Ou os cidadãos portugueses começam a saber interpretar a realidade ou vamos continuar a enojar-nos com notícias como os malefícios dos pederastas, do aborto, miserandos programas de TV, uma comunidade que se ofende profundamente a si própria não se exprimindo capazmente na sua própria língua – nem oralmente nem por escrito –, profundamente carente de sentido cívico, em suma, inapta para determinar o seu futuro. A emigração aí está a prová-lo.
Há que proclamar que o 25 de Abril falhou dramaticamente e que a Igreja – com intangível finura – tem que saber situar-se para se afirmar como vigoroso e prospectivo pilar. Outro tanto se espera dos fortes de consciência, tal como a prevenção contra uma certa historiografia é outro absoluto imperativo.
Guarda-12-XI-06
Por: J. A. Alves Ambrósio
P.S. – Por lapso, no meu último artigo, saiu 1474 para a batalha de Toro. Deveria ter saído 1476. As minhas desculpas.