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Comércio tradicional em crise na Covilhã

AECBP reúne amanhã com os comerciantes para debater iniciativas e estratégias para fazer regressar os consumidores ao centro da cidade

Faz este mês um ano que o Serra Shopping abriu portas, registando nos primeiros quatro meses de actividade um milhão de visitas. Directa ou indirectamente, as compras no comércio tradicional decresceram e 36 das 180 lojas existentes no centro da Covilhã fecharam desde que esta grande superfície comercial, por enquanto a única da região, abriu ao público. A falta de dinamismo tem sido apontada por consumidores e comerciantes para o sucedido, por isso a Associação Empresarial da Covilhã, Belmonte e Penamacor (AECBP) reúne amanhã com os lojistas para debater iniciativas e estratégias para o futuro, adiantou Miguel Bernardo, vice-presidente da associação, remetendo para mais tarde esclarecimentos sobre o estado do comercio local.

Apesar de não responsabilizarem o Serra Shopping pela crise que vivem, o certo é que o impacto do centro comercial neste primeiro ano não foi indiferente aos comerciantes locais, principalmente nos primeiros meses. Mas ainda hoje há quem sinta dificuldades com a concorrência das lojas de marca. É o caso de Maria João Figueira, proprietária da “Loja Nico”. «Foi um ano muito complicado e ainda está a ser. No meu caso, o Serra Shopping abanou o negócio e tive mesmo que despedir a empregada para não fechar as portas», adianta a empresária. Os tempos são difíceis para o comércio tradicional, «não só por causa do “shopping”, mas devido à crise económica do país», acrescenta, considerando ainda que o estacionamento pago na zona central é um grande «entrave» ao negócio.

Também Sílvia Santos, funcionária da “Sapataria Ramalhoso”, responsabiliza a crise económica pelas quebras. É que, na sua perspectiva, e agora que deixou de ser novidade, as pessoas «não vão para o Serra Shopping fazer compras, mas passear, irem ao cinema ou jantar». O mesmo pensa Manuel Diniz, proprietário da “Casa Diniz”, uma das lojas mais antigas da cidade com 52 anos de existência, considerando que assim que a «euforia passa» as lojas do centro voltarão à normalidade, principalmente as que têm «condições e bons artigos».

Com cinco lojas a funcionar na cidade (de vestuário, mobiliário e artigos para a casa e o lar), a “Casa Diniz” mantém uma certa estabilidade financeira que não é comum à grande maioria dos pequenos comércios. Mas para isso houve alguma antecipação à abertura do “shopping”: «Apostámos em artigos de qualidade e reduzimos os funcionários para metade. Em vez de termos 15 ou 16, temos oito e mais três ou quatro familiares a ajudarem», esclarece o empresário, afirmando que o seu público-alvo continua a frequentar a loja como antigamente. O segredo está na relação de «proximidade» e de «confiança» que mantém com os seus clientes, para além da flexibilidade de horário, destaca Manuel Diniz. «Isto é uma loja familiar. Estou aberto aos sábados todo o dia e estou sempre disponível para atender os meus clientes, nem que seja às 11 da noite. Todos me conhecem e, se necessitarem de alguma compra fora do horário de funcionamento, sabem que estou à disposição», garante. A pouca flexibilidade de horários durante a semana (a maioria das lojas fecha às 19h, altura em que grande parte das pessoas está a sair dos empregos) e o facto de estarem fechadas ao sábado à tarde são as principais falhas apontadas pelos consumidores o comércio tradicional.

Câmara quer atrair estudantes para o centro da cidade

«Durante a semana, penso que não haverá grandes mudanças se estivermos abertos mais uma hora. Aliás, podia ser até um risco para nós», refere Sílvia Santos, considerando que a abertura aos sábados à tarde seria uma mais-valia para o comércio tradicional «desde que todas as lojas estivessem dispostas a isso». Maria João Figueira sublinha também a necessidade de se estabelecerem horários comuns a todos os lojistas do centro, apontando ainda como indispensável a «animação e iniciativas que chamem os consumidores». Mas antes disso, «é preciso que haja união entre todos os comerciantes», alerta, pois «só conseguimos mudar o panorama se estivermos todos juntos».

A falta de dinamização do centro é também uma preocupação da Câmara da Covilhã. Carlos Pinto quer chamar de novo os jovens à Praça do Município, de forma a que o Pelourinho volte a ser um «ponto de encontro». Para isso, a autarquia vai «convidar os estudantes universitários a beberem uma bebida no centro e a conviverem entre eles e a população», revelou. Outra das ideias passa por colocar uma cobertura na Rua Direita, à semelhança do que acontece nas ruas comerciais de muitas cidades europeias, de forma a dinamizar o comércio tradicional. Mas para isso será necessário que os comerciantes colaborem, nomeadamente em termos de dinamização e horários, pois a cidade só poderá afirmar-se quando houver oferta. «Algo que não acontece actualmente. Os autocarros param no centro aos sábados à tarde, mas os turistas não têm lojas para visitar ou fazer compras porque estão fechadas», criticou.

Condomínio do Shopping do Sporting em tribunal

Sem movimento e sem vida. É assim que está actualmente o centro comercial “Sporting”, na zona do Pelourinho. Nos últimos meses muitas lojas fecharam e, das que se mantêm, são poucas a cumprir o horário.

Neste cenário também não há consumidores, pois «os que se deslocam a este espaço já sabem o que querem comprar e dirigem-se directamente à loja pretendida», refere Hélder Fernandes, proprietário da loja de roupa “Mingote”, reconhecendo que o centro comercial «decaiu imenso» nos últimos meses. «Mas a culpa não é do Serra Shopping, antes dos próprios comerciantes, que não cumprem os horários de funcionamento e não promovem iniciativas dinâmicas», critica. Por isso, este empresário colocou a administração do centro comercial em tribunal por o regulamento não estar a ser cumprido. «Alguns comerciantes abrem e fecham à hora que querem. Os consumidores que por aqui passam até podem interessar-se por algum produto, mas acabam por desistir porque a loja está fechada durante o horário de funcionamento. Em consequência, perdem o interesse e voltam a este espaço», lamenta. Para Hélder Fernandes, é necessário dinamizar não só o centro comercial, mas também as lojas locais para atrair de novo os consumidores ao centro. A flexibilidade de horários é uma das principais medidas a tomar. «Têm que ser os comerciantes a adaptarem-se às novas realidades e não os consumidores», sublinha. Nesse sentido, este empresário criou mais um posto de trabalho na sua loja para responder às necessidades dos consumidores, estando aberto ininterruptamente das 9h30 às 19h30. Além disso, passou a abrir a loja aos domingos e feriados de manhã.

Liliana Correia

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