«Problemas de coordenação de acção no terreno» deverão ter estado na origem do incêndio de Famalicão da Serra no passado dia 9 que provocou a morte a seis bombeiros, um jovem natural daquela aldeia do concelho da Guarda e cinco sapadores florestais chilenos da equipa helitransportada da Afolceca. Contudo, o comandante dos Bombeiros Voluntários de Gonçalo, que chefiava as operações no terreno naquela altura, garante que a coordenação entre bombeiros foi «correcta e perfeita».
As primeiras conclusões do relatório preliminar foram reveladas por António Costa, ministro da Administração Interna, na quinta-feira da semana passada no Parlamento, na Comissão Eventual para os Fogos Florestais. De acordo com o governante, em declarações à TSF, «tudo aponta, no relatório preliminar, que para além de problemas de coordenação de acção no terreno se verificaram dois fenómenos do ponto de vista do comportamento do fogo», realçou. Assim, verificou-se «uma situação particularmente complicada de fogo de copas e depois uma erupção violenta que apanhou os seis homens numa fase difícil do seu percurso da evacuação», frisou. De resto, «vários outros conseguiram fugir, mas houve seis cujo percurso de fuga foi impossibilitado pelo comportamento do fogo com as consequências trágicas que são conhecidas», reforçou. Segundo o ministro, o relatório apontou problemas «no início do incêndio e não durante a ocorrência», acrescentando que depois «houve um trabalho conjunto entre os bombeiros e os sapadores da Afocelca». António Costa escusou-se a adiantar mais pormenores do relatório que, por enquanto é «confidencial», adiantando que só no Outono é que serão entregues na comissão parlamentar os resultados de todos os inquéritos sobre o acidente. Em resposta às perguntas de Alda Macedo, do Bloco de Esquerda, e do presidente da Comissão, o socialista Rui Vieira, o ministro afirmou que «houve articulação» e que «o corpo de bombeiros de Gonçalo actuou segundo as ordens dos sapadores chilenos», noticiou o Jornal de Notícias, na sexta-feira da semana passada. Como obriga a lei, a intervenção terá sido articulada com o comando distrital de operações da Guarda e «o piloto falou também com os bombeiros», já que o comando operacional lhes competia, diz o JN. O relatório preliminar «não aponta responsáveis directos pelas falhas verificadas» e salienta, por outro lado, que a deficiente coordenação «não foi a causa directa do acidente», revela a mesma fonte. Consensual é que houve um erro de avaliação do perigo da situação. «Todas as testemunhas que ouvimos falaram do fogo como sendo rasteiro, de 30 centímetros, um fogo de caruma», explicou fonte da comissão de inquérito. «Pela grande quantidade de pessoas presentes e pelo facto de haver bombeiros com água, os sapadores entenderam claramente que estavam reunidas condições para trabalharem em segurança», lê-se no JN.
António Fonseca, comandante distrital de operações de socorro do distrito da Guarda, não quis comentar as declarações do ministro. Já Orlindo Cabeças, comandante dos Bombeiros Voluntários de Gonçalo, que comandava as operações no terreno na altura do incêndio, contactado por “O Interior”, começou por frisar que não quer entrar em polémica, porque «infelizmente não vai resolver nada do que aconteceu», lamenta. Contudo, garante que a coordenação entre bombeiros no incêndio de Famalicão esteve «correcta. Estive sempre em contacto com os bombeiros. Agora quanto a forças exteriores aos bombeiros e que entraram no teatro de operações eu não tinha conhecimento», garante. Deste modo, «havia gente no teatro de operações que eu desconhecia» como foram os casos das brigadas helitransportadas, sapadores e técnicos do Parque Natural da Serra da Estrela. Por outro lado, Orlindo Cabeças salienta que «não ficou bem explícito» ao que se refere António Costa quando fala de problemas de coordenação. «A coordenação entre bombeiros, a meu ver, esteve perfeita. Se se estiver a referir à falta de contacto entre todas as forças intervenientes, aí temos que dar a mão à palmatória. Mas a culpa não é do Comandante dos Bombeiros. É um pouco de todos», considera.
Federação dá apoio psicológico aos Bombeiros de Famalicão
A Federação de Bombeiros do Distrito da Guarda, através do seu Gabinete de Apoio Social, está a prestar apoio psicológico aos bombeiros da secção de Famalicão dos Bombeiros de Gonçalo, a que pertencia Sérgio Rocha, o “soldado da paz” falecido no incêndio de dia 9. Os três técnicos, duas psicólogas e um técnico de serviço social, deste Gabinete, depararam-se de início com alguma renitência dos “soldados da paz”. Contudo, posteriormente, e de acordo com um comunicado enviado pela FBDG às redacções, «relataram aos técnicos que se tinham sentido muito sós e continuavam a ter esse sentimento. Segundo eles ninguém lhes tinha dado qualquer apoio e está tudo a ser muito difícil». Por outro lado, «a Comissão de Inquérito não lhes tinha e não lhes dá qualquer tipo de descanso. Sentem-se pressionados, cansados e impotentes perante estas situações todas». No mesmo comunicado, a Federação registou ainda várias situações dignas de «terceiro mundo» na secção de Famalicão dos Bombeiros de Gonçalo como, por exemplo, o facto de «dentro do que é o chamado espaço de “Central” não existe (isto é de bradar aos céus) uma linha de telefone fixa, ou seja, este secção é servida por rede móvel». Isto quando «em Famalicão da Serra é muito difícil ter rede móvel porque está sempre a falhar», reforça.
Ricardo Cordeiro