O anúncio, pelo presidente da Câmara, de que a Guarda irá acolher duas fábricas de cerveja foi recebida com surpresa e regozijo. Segundo Sérgio Costa, o executivo vai alienar quatro lotes na Plataforma Logística a um grupo empresarial espanhol para instalação de duas unidades industriais de cerveja. Trata-se de um investimento de mais de 23 milhões de euros e prevê a criação de mais de 75 novos postos de trabalho. A Guarda não tem tradição cervejeira, nem está próxima de nenhum grande mercado (grande cidade), mas tem água e boa localização geográfica ou logística (e, supostamente, bons argumentos de apoio) que terão sido considerados como fundamentais para este putativo investimento.
O autarca não revelou nomes das empresas, nem pormenores sobre um negócio que ainda estará numa fase razoavelmente precoce. Mas, para além de elevar a autoestima de uma cidade que tem visto muitas promessas e poucas concretizações, ao incluir já a provável venda de quatro lotes de terreno na PLIE permite confiar que esta não será mais uma promessa vã.
Este anúncio chega precisamente na mesma semana em que são divulgados os dados do “Programa de Incentivos à Fixação de Trabalhadores do Estado no Interior”, lançado em julho de 2021 e criado pelo anterior Governo para conseguir a fixação de pessoas em territórios de baixa densidade e promover a conciliação da vida profissional com a vida pessoal.
Até maio, apenas 10 funcionários públicos foram trabalhar para concelhos do interior ao abrigo do programa de mobilidade que tinha a ambição de fixar trabalhadores do Estado nas regiões menos populosas – foram para os concelhos de Abrantes, Castro Daire, Melgaço, Monforte, Sabugal, Tondela, Vieira do Minho, Vila Flor e Vila Verde e a maioria (oito) foram em regime de teletrabalho. Ou seja, a intenção é boa, o plano parecia poder contribuir para contrariar a tendência ancestral de despovoamento do interior, mas a taxa de sucesso foi um desastre. Assim, reconhecidamente, o programa ficou muito aquém das expetativas e exige uma reflexão e análise sobre medidas a adotar e o caminho implementado e a implementar em relação à coesão territorial.
Mas a possibilidade de a Guarda poder receber a instalação de duas fábricas de cerveja obriga-nos a olhar para trás e perguntar pelas muitas promessas que ficaram pelo caminho – promessas nomeadamente de investimento público. Entre outras, continuamos todos à espera da instalação na Guarda do comando nacional da Unidade de Emergência de Proteção e Socorro (UEPS), da GNR, prometida há três anos e considerada uma alavanca determinante para contrariar o êxodo que a cidade vive. É verdade que são processos lentos e é muito difícil reverter a fuga de pessoas que há dezenas de anos se acentuou, mas a Guarda já não tem tempo para esperar, precisa com urgência de investimentos, público e privado, que possam pelo menos estagnar a hemorragia de pessoas e serviços. O adiamento sucessivo da instalação da UEPS faz recordar que, neste país centralista e inclinado, um Governo pretendeu transferir a sede do Infarmed, de Lisboa para o Porto, sem sucesso…
Todos os anúncios serão bem-vindos. Os jovens da Guarda continuam a partir e quem fica parece cada vez mais condenado a viver precariamente e sem opções de futuro. A Guarda e o interior precisam de propostas e empreendedorismo, de projetos e investimentos, que elevem a autoestima quando são anunciados, que garantam emprego e futuro na cidade, no concelho e na região.
Elevar a autoestima
“apenas 10 funcionários públicos foram trabalhar para concelhos do interior ao abrigo do programa de mobilidade que tinha a ambição de fixar trabalhadores do Estado nas regiões menos populosas”