P-Dedicou parte da sua vida a divulgar e a desenvolver os conceitos de Gordon Craig, o seu tutor. Porquê?
R – Não posso dizer com rigor que dediquei a minha vida a desenvolver os conceitos do meu professor, mas é verdade que sempre me senti estimulado pelo seu trabalho e pelo que viria a ser o “Cruciform Theatre”. Poderia dar grandes justificações sobre o desenvolvimento deste conceito, mas considero que houve três momentos essenciais: o primeiro foi aos quatro anos de idade, durante a noite, como se fosse uma espécie de visão. Sonhei com a esquina da rua onde vivia em Nova Iorque e imaginei aí as pessoas a cruzarem-se enquanto cantavam. Sinto que, de alguma forma, este foi o início do “Cruciform Theatre”. A segunda fase tem a ver com a estimulação da ideia de um novo teatro, que surgiu com Gordon Craig, e a terceira aconteceu quando conheci a Ruth e ela me disse que queria criar uma sociedade humana. Então vi que o meu teatro seria para uma nova sociedade. E esse teatro surgiu na escola que fundámos há mais de 20 anos.
P-O que o inspira neste modelo de teatro?
R – Acho que é o sentido de dualidade. Este teatro permite a duplicidade, tal como acontece na natureza, em que tudo é duplo. Por exemplo, neste modelo haverá espectadores a ver o actor de frente quando está no centro da acção, mas outros irão vê-lo virado para a esquerda ou para a direita. E aqui começa a consciência de que tudo é relativo.
P-Gordon Craig sempre disse que o seu teatro era para outro século. Também acha que é assim com o “Cruciform Theatre”?
R – Sim. O que é distinto é a presença das pessoas de diferentes épocas. Na primeira peça em que trabalhei em conjunto com a Ruth, a ideia que ficou expressa é que o tempo não é consecutivo. É simultâneo e as coisas acontecem ao mesmo tempo. Só que, numa peça de teatro, um espectador vê uma determinada coisa que o outro ainda não viu. E isso acontece em “A Balada do Velho Marinheiro”, em que as cenas são vistas de vários ângulos pelos espectadores. Mas o “Cruciform Theatre” não é só o cenário, a arquitectura também é fundamental, pois a acção tem que encontrar uma forma de manter a energia e o equilíbrio.
P – Como define então o “Cruciform Theatre”?
R – A melhor forma de o compreender é através do espectador. Ele não assiste apenas à peça, tem também a tarefa de ligar cada momento da acção. E assim, o que ele vê é tão importante como o que não vê. O espectador passa a ser um elemento participativo na acção. E este é um modelo de teatro diferente do convencional. Não há um palco definido, pois toda a estrutura, em forma de cruz simétrica, é o palco, mesmo os locais em que se sentam os espectadores.