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«Somos o único partido que poderá afrontar o poder local»

Ana Monteiro, candidata do Bloco de Esquerda à Câmara da Covilhã

P-É a primeira vez que o Bloco de Esquerda se candidata à Câmara da Covilhã. O que os motivou a apresentarem a candidatura?

R-Porque é uma força que faz falta na Covilhã. O BE está desligado de determinados interesses e pressões, e poderá exercer o seu espírito crítico de forma autónoma. Por esse facto, poderá encontrar novos ângulos para resolver os problemas do município. As soluções apresentadas pelo poder local, bem como pela oposição, já estão gastas, o que levou os munícipes a perderem o entusiasmo político e de participação. Sou candidata para levar uma mensagem às pessoas, para que percam os seus medos e exerçam o seu direito de cidadania. Pretendemos trazer as pessoas para a política e abordar temas que preocupam a população.

P-Foi difícil compor esta lista?

R-Eu diria antes que não foi fácil. Há muita gente que está a colaborar connosco neste momento, mas que não quis dar a cara com medo de represálias. Aliás, tem-se notado nesta campanha algumas pressões do poder local.

P-Como assim?

R- Há sempre alguém que tem um familiar que está dependente da autarquia ou alguém que precisa de um subsídio para uma associação. Por isso, não foi fácil constituir esta lista. Por outro lado, o BE ainda não está muito enraizado na Beira Interior. Normalmente, associa-se o BE a uma ideia de associação citadina e urbana e nós queremos implantar o partido na Beira Interior.

P-Dar notoriedade ao partido é uma das prioridades desta candidatura?

R-Sim. Esta candidatura pretende, no fundo, lançar a voz do Bloco de Esquerda nesta franja do interior do país. E isso já se verifica nestas eleições, pois já temos candidaturas na Sertã, Castelo Branco, Covilhã, Belmonte, Guarda e Figueira de Castelo Rodrigo. Estamos aqui em bloco pela Beira Interior.

P-Que resultados espera atingir nestas eleições?

R-Como é a primeira vez que estamos a concorrer, não temos tanto aquela ansiedade de contagem de votos. O BE está aqui para implementar a sua voz. Achamos, aliás, que é uma voz necessária no concelho. Agora, como qualquer candidatura, é legítimo que ambicionemos conquistar a Câmara, mas não somos um grupo que persiga essa ilusão. Até porque temos a consciência de que será muito difícil ou praticamente impossível. Mas se os munícipes nos confiarem alguns lugares na Assembleia Municipal, já será muito bom pois poderiamos assim ter uma participação mais directa e conhecer o funcionamento do poder local por dentro, que está neste momento inacessível aos munícipes.

P-O que falta fazer pela Covilhã?

R-Falta uma política económica e alternativa, planificada e organizada. Falta uma verdadeira política social, que discrimine positivamente os indíviduos com mais carências. Falta uma política cultural que sirva as ambições das pessoas e uma política de urbanismo. Em suma, falta quase tudo na Covilhã no plano imaterial. E quero aqui realçar que o Bloco de Esquerda vai fazer uma campanha alegre e dinâmica para mostrar estes problemas e as nossas ideias, pois assumimo-nos como um partido político, e não como uma empresa que dá esferográficas, calendários ou chouriços. A única coisa que temos para oferecer são as nossas ideias e vamos pôr no terreno apenas aquilo que é essencial.

P-Que ideias irá defender então até ao dia 9?

R-Uma das nossas prioridades passa por descentralizar a gestão municipal e implementar um orçamento participativo. Temos uma gestão municipal muito fechada, autoritária e que se centra no trabalho de determinados vereadores como se eles fossem os donos da verdade. Queremos acabar com a ideia que as pessoas têm de que o poder local é corrupto e que permite o enriquecimento dos familiares mais directos. Queremos transformar a Câmara Municipal numa instituição pública que transmita uma faceta de “pessoa de bem”. O combate ao desemprego e à pobreza, que estão a crescer galopantemente na Covilhã, será outra das nossas prioridades. Defendemos uma verdadeira política alternativa de apoio e acompanhamento social aos mais carenciados, que se conjugue com uma política económica alternativa. Existe na região um grande potencial de recursos económicos que não estão a ser aproveitados. É o caso dos recursos energéticos e da agricultura biológica. O eco-turismo também não está a ser aproveitado como um verdadeiro potencial de economia alternativa. Temos também um grande potencial gastronómico que passa pelo cabrito, mel e até pelo arroz doce, que poderia ser revitalizado para outras áreas e ser um manancial de emprego para a região. Outra das ideias é a defesa do nosso eco-sistema, combatendo a poluição e a degradação ambiental. O problema da falta da água também tem que se resolver urgentemente, mas a implementação de uma barragem tem de ter em conta a fragilidade do ecossistema circundante e os interesses das populações em seu redor.

P-Defendem também uma política cultural e de educação alternativa…

R-Sim. Achamos que a Câmara deverá ter uma política cultural organizada e concertada. Apesar de defendermos que as associações estejam independentes política e economicamente da autarquia, achamos que a autarquia não se pode demitir de ter uma verdadeira política cultural. O Centro de Artes, tão prometido, deverá ser uma realidade, assim como um maior apoio aos jovens que se queiram expressar artísticamente. Uma das ideias culturais que propomos é a realização de um festival infanto-juvenil anual. Aliás, estamos em condições de nos comprometermos com a realização deste evento, mesmo que não tenhamos assento nos órgãos autárquicos. Para a educação, creio que seria uma grande aposta da Câmara se atribuísse gratuitamente os manuais escolares do primeiro ciclo de ensino obrigatório, bem como a criação de uma residência estudantil para acolher as crianças do ensino secundário que vivem em áreas distantes da cidade. Defendemos ainda mais valências e dinamismo na biblioteca municipal. Propomos, por isso, que a biblioteca pública funcione em horário pós-laboral e ao fim-de-semana, além de uma maior libertação de livros.

P-A política de urbanismo da Covilhã tem sido uma das críticas do BE. O que propõem?

R-Propomos acima de tudo outros projectos e valores. A nossa grande aposta é a revitalização das casas abandonadas. A expansão da urbanização selvagem e especulativa está a ser muito prejudicial para as finanças locais, para a estética e dinamismo da cidade. O BE é o único partido, neste momento, que apresentou uma proposta para a Lei das Finanças Locais e que vem ao encontro desta ideia de urbanismo. É a construção que alimenta directamente o poder local em termos financeiros e, por isso, defendemos que todos os impostos camarários devem ter uma gestão nacional e não directa, para não criar esta assimetria entre o centro e a periferia da cidade. Consideramos que essa gestão deve ser nacional e distribuída de acordo com o dinamismo e as necessidades do poder local, acentuando a necessidade de haver fundo de solidariedade nacional para com o interior do país. Também somos grandes críticos à politica de habitação social que este executivo tem, porque consideramos que está a “chutar” os mais pobres para as áreas mais distantes da cidade. Na nossa opinião, deverá haver uma reconstrução do centro da cidade e as pessoas que lá habitam, que são pessoas modestas e com poucos recursos, devem ser apoiadas e não chutadas para outras zonas. No fundo, deveria criar-se uma vitalidade da cidade em termos culturais e sociais e não abrir aquela área à especulação imobiliária. E com isso, a própria área do pelourinho iria ser revitalizada em termos comerciais.

P-Nesse aspecto, acha que a empresa “Nova Covilhã” poderá poderá resolver alguns desses problemas?

R-Somos contra estas empresas e creio que essa sociedade tem como objectivo empurrar as pessoas do centro da cidade e permitir a especulação imobiliária. Temos imensos exemplos no país em que há certos indíviduos com alguns recursos financeiros que compram no centro da cidade habitações para arrendar ou então como segundas moradias, e são zonas que neste momento não estão habitadas. Um outro problema, é que tudo se está a centralizar numa determinada zona da Covilhã, a que chamamos de baixa. Uma economia verdadeiramente moderna, uma visão política e socialmente moderna seria espalhar mais serviços e empresas pelas aldeias e vilas da cidade. Uma das nossas propostas é criar micro parques industriais em diversas freguesias. Isso iria revitalizar bastante a economia nessas áreas e cumpre esta visão organizada, moderna e alternativa do concelho.

P-Se não conseguirem ter assento nos orgãos autárquicos, vão continuar a manter uma posição critica na cidade?

R-Sim. Aliás, essa é umas das propostas da nossa candidatura e creio que somos o único partido que poderá afrontar o poder local.

P-Como classifica este mandato da maioria PSD na Câmara?

R-Este mandato assenta em dois pilares. Em primeiro lugar, no centralismo e autoritarismo. Em segundo, assenta numa política de girassol, das grandes obras.

P-Esse é o aspecto negativo que aponta ao executivo?

R-O aspecto mais negativo é o esquecimento das pessoas. É a política do autoritarismo e de falta de discriminação positiva para as pessoas com mais dificuldades. Neste momento, há pessoas a passar fome na Covilhã e a Câmara está desfasada dessa realidade. É uma política que promete o “El Dourado”, mas que afunda financeiramente a Câmara, sem que se assuma com humildade que há uma grande dívida, que tem que começar a ser paga.

P-E de positivo?

R-A ideia do Parkurbis, apesar de não ter sido parida pelo senhor Carlos Pinto, como quer fazer passar, poderia ser uma grande ideia, se realmente cumprisse os objectivos. Isto porque somos grandes críticos à forma como foi construído. Gastou-se muito dinheiro num edifício que só tem neste momento escritórios com acesso à internet de banda larga. Tratando-se de um parque de ciência e tecnologia, onde estão os laboratórios? O que é que a Microsoft vai lá fazer? Instalar-se num escritório com internet de banda larga? Com tanto dinheiro gasto naquela estrutura faraónica, onde é que a autarquia vai agora buscar o dinheiro para construir os laboratórios e as grandes fábricas? Além disso, interrogo-me ainda sobre as oportunidades de emprego do Parkurbis, uma vez que ninguém fala delas.

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