Sociedade

Última taberna da Guarda já não volta a abrir

Escrito por Inês Gonçalves

Conhecido como senhor Toneca ou Nico, o proprietário da carismática Taberna do Benfica faleceu na passada quinta-feira, aos 83 anos. Com ele desapareceu a última taberna do centro histórico da Guarda.

Natural de Aldeia Viçosa, António dos Santos era acarinhado por todas as pessoas que faziam questão de o visitar, junto à Porta do Sol. «Quem entrava pela primeira vez prometia regressar e os clientes habituais faziam parte do dia-a-dia do meu avô», lembra a neta Ana Januário. Todos o descrevem como «afável, carinhoso, simpático e sempre disponível para ajudar os outros».
Nos últimos tempos devido ao estado de saúde do proprietário, a taberna só abria de vez em quando por vontade da filha e já é certo que o estabelecimento não voltará a abrir. Aquele que era um local de visita para quem passava pela Guarda, fecha agora portas e deixa apenas memórias aos seus antigos clientes, que não esquecem o pitoresco do local, cujo chão e balcão permanecem os mesmos há décadas. Tal como as portas de vaivém, pintadas a vermelho. O que ninguém esquece é o senhor Toneca. Fernando Cabral recorda-o como uma pessoa que «fazia parte da cidade». «Fui vizinho da taberna durante uns anos e, para além da afinidade de benfiquista, desde os meus 7 anos que me lembro dele ser a marca do estabelecimento», declara o professor de Educação Física na Guarda.
Já para Francisco Nascimento, atual presidente da Casa do Benfica da Guarda, perdeu-se «o último reduto de uma tradição que a cidade tinha». Apesar do nome, sempre foi uma taberna que acolheu todos de igual forma, independentemente do clube. «É uma perda enorme para a Guarda, fui cliente e tive oportunidade de estar lá com pessoas que não eram do Benfica. O senhor Toneca sempre foi uma pessoa alegre e sentimos muito a perda dele», confessa o dirigente. Durante seis décadas, António dos Santos pugnou sempre por preservar a tipicidade do estabelecimento como um espaço que resistiu ao tempo e onde os copos ainda eram lavados à mão. O homem que era a “alma” da taberna deixa boas recordações a todos aqueles que o conheceram, mas principalmente aos que lhe eram mais chegados. Ana Januário, a neta mais velha de António dos Santos, recorda que «estava sempre pronto para uma conversa sobre coisas da vida e da própria cidade». «Costumo dizer que ele não era adepto de clubes, era adepto do povo», revela.
A neta lembra-se sobretudo do período da adolescência, quando «passava tardes na taberna, à braseira», e as vezes que, às escondidas da mãe e da avó, o avô lhe dava chocolates que guardava por cima do frigorífico. O mítico estabelecimento do centro histórico foi gerido durante cerca de 60 anos por António dos Santos e a mulher Maria de Lurdes. No nº33 da Rua Rui de Pina, junto à Porta do Sol, servia-se vinho a copo, ginginha, jeropiga e petiscos. O vizinho Manuel Pascoal, barbeiro estabelecido na rua em frente à taberna há 43 anos, afirma que sempre conheceu aquele estabelecimento com a traça original. «A tradição das tabernas acaba por morrer com o fim do senhor Toneca. Aquela era a tradicional taberna, quer em termos de traça e cultura, pois sempre manteve as características de uma taberna. Recebia o cliente com o seu sorriso, respeitava-o e isso era importante», sublinha Manuel Pascoal.

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Inês Gonçalves

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