A estratégia de afirmação da Guarda pela cultura vai sofrer mais um rombo com a saída de João Mendes Rosa da direção do Museu local. O anúncio caiu que nem uma bomba no Dia Internacional dos Museus, comemorado na segunda-feira, e terá efeitos a 1 de junho, dia em que o também ensaísta, historiador e arqueólogo vai cessar funções para assumir a chefia da Divisão de Cultura da Câmara de Oeiras, cargo para o qual tinha vindo a ser convidado nos últimos meses.
Segundo apurou O INTERIOR, o “assédio” de Jorge Barreto Xavier, atual diretor municipal de Educação, Desenvolvimento Social e Cultural daquela autarquia e ex-secretário de Estado da Cultura com raízes na Guarda, surtiu efeito numa altura em que João Mendes Rosa se incompatibilizou com o vereador do pelouro da Cultura na Guarda, Victor Amaral, e com a chefe de divisão desta área, Alexandra Isidro. Em Oeiras, o ex-diretor do Museu da Guarda será responsável pelos vários núcleos museológicos do município, atualmente em reestruturação. O caso foi abordado por Carlos Chaves Monteiro no período de antes da ordem do dia na reunião de Câmara, que decorreu na segunda-feira por videoconferência. No final, o presidente da autarquia guardense apresentou uma versão diferente aos jornalistas ao dizer que a decisão de João Mendes Rosa prende-se «exclusivamente» com «questões profissionais, familiares e pessoais, além da própria natureza do convite que remete para o incremento das suas áreas de formação: Literatura, Arte e História».
«O município da Guarda reconhece e agradece os préstimos de serviço público pelo excelente trabalho desenvolvido pelo doutor João Mendes Rosa na direção do museu, após a transição da sua gestão para a alçada municipal, tendo-se alcançado um novo rumo vocacional e programático daquele importante equipamento cultural da cidade», acrescentou o autarca em forma de despedida. Para Chaves Monteiro, aquele equipamento «é hoje respeitado e reconhecido como agente cultural efetivo no país e, pelo menos, no contexto peninsular». O edil recordou que o museólogo veio para a Guarda em 2016, em regime de mobilidade da autarquia do Fundão, e acrescentou que o município «nunca limitou ou “cortou as pernas” a ninguém» na prossecução dos «seus anseios» e «sonhos profissionais».
Thierry Santos, quadro técnico da instituição, será o coordenador interino do museu e contará neste período de transição com o apoio de João Mendes Rosa. Também Pedro Gadanho, diretor executivo da candidatura da Guarda a Capital Europeia da Cultura, terá «uma colaboração ativa nesta nova fase» do equipamento cultural, anunciou Chaves Monteiro, que disse «saber bem da competência» do diretor cessante do museu. «Era um dos que já sabia bem para onde devíamos caminhar e era um elemento essencial na estratégia cultural da Guarda, que também cresceu muito com o seu trabalho», admitiu o presidente da Câmara. O edil confirmou ainda que João Mendes Rosa não vai continuar a colaborar com o projeto da Capital Europeia da Cultura, onde era programador da área da história, património e artes visuais.
Impulsionador do renascimento do Museu da Guarda
Natural da Guarda, João Mendes Rosa é licenciado em Artes Visuais e em História/ Arqueologia e mestre em Arqueologia/Epigrafia Latina pela Universidade de Salamanca. É investigador da Universidade de Salamanca (Departamento de Pré-história, História Antiga e Arqueologia) na área de Arqueologia da Paisagem e Epigrafia desde 2008. Ensaísta, ficcionista, poeta, historiador, museólogo, arqueólogo, dramaturgo e artista plástico, publicou até ao presente mais de 30 livros, desde o romance aos estudos arqueológicos e museográficos, da poesia à biografia, passando pela investigação histórica, conto e teatro. É também cronista de O INTERIOR.
João Mendes Rosa é ainda professor e formador na área da Museologia e Gestão do Património, bem como colaborador da Diocese da Guarda para a área da Arte Sacra. Enquanto museólogo, projetou a instalação do Museu António Guterres (Donas), Casa-Museu D. João Oliveira Matos, Centro de Interpretação da Arte Rupestre (uma parceria do Museu do Côa), Museu da Imprensa e Tipografia e o Museu Arqueológico Municipal do Fundão e inúmeras mostras museográficas patentes em vários pontos do país.
Na Guarda deu novo impulso ao museu regional, que, sob a sua égide desde 2016, recebeu várias exposições de artistas contemporâneos de renome nacional e internacional, como Paula Rego e Santa-Rita Pintor ou obras da Fundação Calouste Gulbenkian, entre outras iniciativas arrojadas para uma cidade do interior do país. Foi também o mentor do Simpósio Internacional de Arte Contemporânea (SIAC) da Guarda, que teve no ano passado a sua quarta edição e não se realizou em 2020 devido à pandemia da Covid-19.