Sociedade

Demissões destapam carências do Hospital da Guarda

Escrito por Jornal O Interior

A demissão de três coordenadores de serviço fez soar o alarme no Hospital Sousa Martins por causa da falta de meios e de recursos humanos. A Ordem dos Médicos fala em «graves problemas» que o Ministério da Saúde tem que resolver para evitar que a unidade guardense «se afunde ainda mais na rampa descendente em que se encontra».

A Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos agendou para dia 19 uma reunião com todos os diretores de serviço do Hospital Sousa Martins, na Guarda, para avaliar «os graves problemas» da unidade e decidir que posições poderão ser tomadas para obrigar o Ministério da Saúde a resolvê-los.

O encontro foi agendado após três coordenadores da área cirúrgica, bloco operatório e cirurgia de ambulatório terem apresentado a demissão há duas semana, invocando, alegadamente, falta de meios e recursos humanos para trabalhar. «Acho que a ULS da Guarda está numa situação muito complicada. Não é um problema recente. O hospital está numa rampa descendente da qual tem imperativamente de sair sob pena de se afundar definitivamente», alerta Carlos Cortes. O presidente da Secção Regional do Centro sublinha que esta é uma «intervenção inédita» da Ordem nestes últimos anos porque há situações «absolutamente dramáticas» e estas demissões são «um sinal de alarme para chamar a atenção da tutela para os problemas do hospital». O responsável adianta que a Ordem tem vindo a acompanhar a situação do Sousa Martins e considera que os médicos e outros profissionais de saúde têm demonstrado «um enorme sentido de responsabilidade ao alertar para a degradação» dos serviços.

O problema é que os mesmos não têm sido resolvidos. «É muito importante o hospital ter mais estabilidade. Esperamos que os responsáveis, Conselho de Administração e tutela, se empenhem num hospital já muito fragilizado», considera, lembrando que «todos os hospitais têm problemas», como a escassez de recursos humanos e a falta de meios, mas o caso da Guarda é «diferente» por ser do interior. «Não pode haver utentes de primeira e outros de segunda que estão penalizados no acesso aos cuidados de saúde por má organização ou por desvalorização pelo Ministério da Saúde», critica o clínico. Carlos Cortes reitera que a Ordem tem vindo a reportar «sistematicamente os graves problemas» da ULS da Guarda ao Conselho de Administração, à Administração Regional de Saúde (ARS) do Centro e ao Ministério, «sensibilizando para a necessidade premente de resolver estes problemas e não prejudicando ainda mais os habitantes do distrito».

 

Também o Sindicato Independente dos Médicos (SIM) apela à ARS que «procure soluções» para o Hospital da Guarda. Em comunicado enviado às redações, o SIM solidariza-se com os coordenadores demissionários em «protesto pela falta de condições de trabalho e de recursos humanos». Apela ainda à presidente da ARS para que «encare os problemas de frente e procure soluções para um hospital muito carenciado». As demissões provocaram uma onda de reações. Os deputados do CDS-PP Isabel Galriça Neto, João Rebelo e Ana Rita Bessa questionaram a tutela sobre o caso: «Em causa estará a alegada falta de controlo, por parte do Conselho de Administração, na aquisição de material cirúrgico, nomeadamente vários procedimentos relacionados com a compra de material para Ortopedia, Urologia e Cirurgia, e também de alegados conflitos de interesse entre médicos com responsabilidade nessa aquisição e empresas que fornecem os materiais», lê-se no requerimento apresentado na Assembleia da República. Os centristas também querem saber se o ministro Adalberto Campos Fernandes tem conhecimento e confirma «as denúncias de várias irregularidades relacionadas com a compra de materiais, concursos e contratos de prestação de serviços».

E aproveitam a missiva para esclarecer se a presença na ULS guardense de elementos da Inspeção-Geral das Atividades em Saúde e da Autoridade para as Condições do Trabalho estará «relacionada com essas denúncias». Também o deputado do PSD Carlos Peixoto apresentou um requerimento do mesmo teor.

O que diz a ULS

A administração da ULS respondeu entretanto aos centristas, confirmando o pedido de demissão de coordenadores de áreas de gestão integrada (blocos operatórios e da área cirúrgica), «profissionais escolhidos e nomeados pelo atual Conselho de Administração (CA) para melhorar a articulação entre serviços clínicos», e de uma das duas coordenadoras da Unidade de Cirurgia de Ambulatório.

«Os dois primeiros resultaram de constrangimentos decorrentes da implementação de novas regras internas conducentes a um maior rigor na gestão dos materiais cirúrgicos e da resistência de aceitação das mesmas por alguns dos pares. A coordenadora da área cirúrgica manifestou, no entanto, a sua disponibilidade para continuar funções como adjunta da Direção Clínica», adiantou o CA em comunicado. Neste caso, a médica ter-se-á demitido «por excesso de trabalho associado a esse cargo, que exerce em acumulação e sem prejuízo da sua atividade clínica». A administração presidida por Isabel Coelho acrescenta que «ninguém manifestou querer sair por rutura com o atual CA e todos se prontificaram em continuar a colaborar com o mesmo».

A ULS refere ainda que o caso do concurso de cirurgia e ortopedia anulado, por alegadas irregularidades denunciadas por um dos potenciais candidatos, deveu-se «à existência de um erro aritmético na fórmula do cálculo matemático, que legalmente poderia até não tornar necessária a sua anulação». Por isso foi decidido anular o procedimento para «afastar qualquer dúvida quanto à transparência na condução do mesmo», justifica o CA. «Neste momento os processos dos concursos, quer dos diretores de serviço, quer de aquisição de material cirúrgico e ortopédico, continuam garantindo a transparência, a concorrência e o rigor na sua condução», acrescenta a administração. Sobre as denúncias de ilegalidades na contratação da empresa de segurança privada, a ULS sublinha que o concurso foi feito «com total transparência e com respeito a todas as disposições legais» e que é «alheia aos motivos que presidiram à participação que os funcionários dessa empresa fizeram à ACT». E confirma ainda a vinda de um inspetor da IGAS à Guarda, mas para fazer «uma inspeção temática de rotina, marcada há mais de uma semana e sem qualquer elo de ligação com os factos apresentados».

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