Reportagem Sociedade

Cerimónias adiadas deixam setor dos eventos «à deriva»

Escrito por Jornal O Interior

Era a altura mais rentável do ano para o setor. O calor e os regressos temporários tornavam os meses de Verão perfeitos para agendar celebrações, mas a pandemia veio alterar os planos. Cerimónias familiares foram «adiadas» em massa deixando em suspenso todos os que delas dependem para viver.

«Tudo isto está muito diferente, muito esquisito». É assim o Verão pós-pandémico para os profissionais que dele tiravam proveito. Agosto era mês de férias, reuniões familiares, casamentos e batizados que agora ficam cancelados por tempo determinado, deixando muitos negócios no limbo da incerteza. Proprietários de quintas, de lojas de roupa de ocasião, fotógrafos, “wedding planners” e floristas são apenas alguns dos profissionais cujo negócio está “confinado” pelas restrições sanitárias e não têm perspetivas para o regresso à normalidade.

Na Quinta do Prado Verde, em Vilar Formoso, «não há nada marcado» para este ano. De acordo com Pedro Monteiro, responsável pelo espaço, estavam nos planos pré-covid «20 casamentos e 10 batizados», mas «foi tudo anulado». A abertura de fronteiras tem sido benéfica para o negócio – que também funciona como restaurante –, só que em pleno Verão o responsável diz que todos se sentem «um bocado à deriva». Também na Quinta de Santo António, em Maçainhas de Baixo (Guarda), não há festas na agenda. Para este ano estavam marcados cerca de 150 eventos, mas foi tudo cancelado, de acordo com António Machado. O proprietário fala em quebras «da ordem dos 99 por cento» face a 2019 e diz que a explicação está, em grande parte, nas restrições e precauções impostas para prevenir o contágio, como a utilização de máscara e o distanciamento social, que prejudicam o convívio.

Carlos Pimentel, fotógrafo covilhanense, tem nos casamentos «o grande foco» do seu trabalho. Este ano «foi tudo adiado» para 2021 e, em pleno Verão, tem apenas um matrimónio na agenda. O profissional contabiliza «perdas na ordem dos 80 a 90 por cento» face a 2019 e mostra-se cético quanto à possibilidade de recuperar o volume de negócios que tinha antes da pandemia. «Costumava ter entre 20 a 25 trabalhos por Verão», uma realidade que, acredita, só se repetirá «lá para 2022, 2023…». Michael Correia, fotógrafo e proprietário da FotoMedense & ContraLuz, na Mêda, confirma o cenário de adiamentos e diz que isso vai resultar «numa agenda sobrecarregada» no próximo ano. Segundo o fotógrafo, as razões para os cancelamentos prendem-se com a ausência dos familiares e com «a forma» como iria decorrer a festa. «O matrimónio é uma festa de afetos e [com as preocupações sanitárias] toda a gente iria estar mais restringida», explica.

Percentagem das perdas? «Nem lhe sei dizer!»

Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) foram realizados 32.595 matrimónios em Portugal em 2019, um número que deverá baixar significativamente este ano. Nas Beiras e Serra da Estrela houve 533 casamentos, 131 dos quais na Guarda, o concelho mais prolixo da Comunidade Intermunicipal.
Um estudo elaborado pela BestEvents (empresa que organiza feiras do setor) e pela revista “I Love Brides” revela que a pandemia levou a que 91,05 por cento dos casamentos fosse adiado ou cancelado em Portugal. De acordo com o estudo, que reúne as respostas de 231 empresas do setor, foram realizados até julho apenas 2,5 por cento dos casamentos previstos para este ano, enquanto 52 por cento das empresas prevê quedas superiores a 70 por cento na faturação. Esta é uma percentagem coerente com os relatos de quem vive das ocasiões especiais, mas que nem todos conseguem confirmar com exatidão.

José Ferreira é proprietário da loja especializada Nani Noivas, na Guarda, e garante que o negócio está «muito mau» este ano. Quanto a perdas, prefere não especificar: «Nem lhe sei dizer e, se quer saber, acho que prefiro não saber», lamenta. O responsável adianta que já há noivas a «comprar vestidos para o ano», mas também houve muitas «que estavam para comprar em março e desistiram». Para José Ferreira, «a economia nunca devia ter parado» e avisa que, «se voltar a paralisar, isto acaba tudo».

Paulo Cabeças, dono da ComSentido, empresa de planeamento de eventos, fala mesmo em perdas «de praticamente 100 por cento», pois o negócio chegou a parar por completo nos meses de confinamento. Durante esse período beneficiaram do regime de “lay-off” simplicado, mas as «perdas foram muito avultadas». Apesar de não se dedicar em exclusivo aos casamentos, esta é uma área importante da atividade da empresa sediada em Belmonte que, aliás, se materializa na organização da feira especializada BeiraNoivos. No evento, que estava agendado para outubro no Pavilhão da ANIL, na Covilhã, participam muitos outros empresários que foram também afetados pelo cancelamento do certame. Paulo Cabeças afirma que na região «houve muita gente a desistir de casar», outros adiaram para o próximo ano. Mesmo perante o cenário desfavorável, o responsável ressalva que «depois da tempestade vem a bonança» e tem confiança que 2021 será um ano mais positivo.

Sofia Craveiro

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