Região

Faia Brava, um paraíso natural

Faia Brava
Escrito por Efigénia Marques

A primeira reserva natural privada em Portugal fica entre Pinhel e Figueira de Castelo Rodrigo

Situada entre as freguesias de Algodres, Vale Afonsinho e Cidadelhe, a Reserva da Faia Brava foi a primeira reserva natural privada em Portugal. Criada há 21 anos, a reserva foi buscar o nome à escarpa rochosa junto ao Rio Côa, no Norte daquele extraordinário território de vida selvagem e natureza. Um ninho de águia-de-bonelli levou os biólogos António Monteiro e Ana Berliner – que ainda hoje é vice presidente – a fundar a Associação Transumância e Natureza (ATN) para tentar proteger a espécie que ainda se encontra em risco de extinção. Hoje, com mais de 1.000 hectares, a reserva é atravessada pelo Rio Côa e é gerida pela ATN atualmente presidida pelo holandês Henk Smit.
Entrando pela porta sul, à descoberta dos muitos caminhos (em terra batida) e trilhos do espaço, é no miradouro que se pode ver, em grande panorama, a escarpa que dá nome à reserva, assim como a aldeia de Cidadelhe (desde onde o desfiladeiro para o vale do Côa é notável e onde nidificam os abutres). «Daqui conseguimos visualizar os limites da área, o Parque Arqueológico do Côa, com o qual temos uma ligação forte, e as freguesias que circundam a reserva», adianta Vanda Brás, coordenadora da ATN. Dentro dos limites da área protegida existe um grande leque de biodiversidade, como as aves rupícolas, milhafres, águias-de-bonelli, abutres negros, águia imperial e ainda cavalos garranos e vacas maronesas em regime selvagem ou semisselvagem. Por estas terras respira-se a natureza, sente-se a vida selvagem, sente-se o cheiro da terra e ouve-se o chilrear dos pássaros como único ruído que interrompe o silêncio de hectares de campo.
São cinco os proprietários privados estrangeiros que compraram terrenos à volta (zonas de intervenção florestal onde a ATN faz a gestão e manutenção) para ajudar a expandir a Faia Brava enquanto reserva e zona natural adjacente. «É muito importante que adquiram terras, pois temos a visão de criar um corredor ecológico em toda a área do Vale do Côa. Escolhemos terras estratégicas que estão perto da Faia Brava para começarmos a dar esse impulso ao vale e à natureza existente», adianta Vanda Brás. A reserva obtém financiamento maioritariamente através de candidaturas e fundos europeus para realizar a manutenção do território e a preservação da natureza. «Neste momento estamos a terminar um projeto que vamos entregar com um leque de parceiros diferentes, como o Douro Internacional, o Vale do Tejo e também parceiros espanhóis, sobre o abutre preto, desenvolvido por organizações não governamentais como a nossa», exemplifica a responsável da ATN.
Além destes projetos focados na fauna, está em curso uma iniciativa para reflorestar o Vale do Côa que foi «muito fustigado por incêndios no passado» e onde a ATN pretende «plantar 10 mil árvores autóctones até ao final de 2022 e já plantamos 3 mil» explica a coordenadora da reserva, pois «se tivermos mais árvores temos ainda mais vida animal». Com 2,5 quilómetros de extensão, o Trilho dos Biólogos marca outro percurso que se pode explorar na Faia Brava, acompanhado por um guia que explica os trabalhos a ser desenvolvidos. Contudo, existem planos para desenhar novos trilhos que podem começar desde Cidadelhe. A criação de um banco de sementes interno é outra das ambições da Faia Brava, que depois será «florestada naturalmente pela natureza e pelos animais», diz a responsável.

Mais visitantes estrangeiros do que portugueses

Na Faia Brava é possível realizar passeios, nomeadamente em viatura todo-o-terreno, acompanhados por guias da ATN ou operadores turísticos que colaboram com a associação, que permitem conhecer e visualizar alguns animais que habitam estas terras. O percurso é realizado de jipe, dadas as condições do terreno que «não foi alterado para manter a natureza das terras», e com esta visita «existe uma maior possibilidade de avistar animais». Durante os percursos é explicado como surgiu a ATN e a Faia Brava, os projetos que estão a ser desenvolvidos, sendo «muito interessante esta troca de ideias com quem nos visita, pois podemos ter sempre pessoas que nos deixam ideias para complementar o projeto», sublinha Vanda Brás.
Com projetos para os próximos 100 anos, a Faia Brava carateriza-se pela integração da natureza, de forma sustentável, e pela junção de ideias que a responsável considera «importante, para tudo aquilo que temos para o futuro, para que possamos usufruir desta natureza tão selvagem», afiança. A reserva teve um crescimento de visitas durante a pandemia porque, segundo a responsável, «as pessoas precisavam de respirar e foi uma surpresa muito grande, com gente a chegar de Lisboa, Porto ou do estrangeiro».
Na reserva os animais são monitorizados pelos biólogos da ATN, que seguem a par e passo os dias das aves, cavalos, bovinos e até a vida dentro das charcas. A colaboração com universidades é «uma mais-valia» para a Faia Brava e para a ATN, sendo partilhados dados entre biólogos da associação e equipas de investigação, uma vez que veem a reserva como um «laboratório vivo e um centro de investigação natural, único no país», sublinha Vanda Brás. O percurso que se faz de jipe pode também ser feito a pé ou de bicicleta, mas para tal é necessário contactar a associação e pagar a visita. De resto, a coordenadora apela a que deixem a Faia Brava como a encontraram: «Se virem portaleiras fechadas, que as mantenham fechadas, pois existem equipas de campo a trabalhar, a fazer a monitorização animal», refere, pedindo também para não se deitar lixo para o chão e não fazer muito ruído, principalmente junto às escarpas.
Para os responsáveis da ATN, os visitantes são sempre bem-vindos, mas com o «máximo respeito» pela natureza para que «as aves não deixem de nidificar aqui». Os sobreiros são uma das marcas do território, com uma grande população de árvores na reserva, sendo a maior macha de sobreiros do distrito da Guarda – onde se destaca um sobreiro com cerca de 400 anos – sendo a «desbóia» da cortiça feita apenas para renovação das árvores sem aproveitamento económico. Chegando às Hortas da Saboia, a parte mais a norte da reserva, encontramos o centro de acolhimento e receção da Faia Brava, onde os visitantes podem pernoitar em tendas da ATN. «É possível acampar aqui, é o nosso ponto de referência, muito devido aos acessos que são melhores que os do lado sul da reserva», justifica Vanda Brás.
A Faia Brava tem na sua estratégia trabalhar o ecoturismo, apesar de não ser o foco principal, «é algo que queremos impulsionar, turismo de ambiente em pequena escala», acrescenta a responsável. Com nove funcionários no momento, a ATN vai continuar a proteger a primeira reserva privada em Portugal de forma a manter a vida selvagem segura e sustentável. Entretanto, Vanda Brás deixa o repto para que mais portugueses visitem e conheçam a natureza do Nordeste do distrito da Guarda até porque «recebemos mais estrangeiros do que portugueses que sabem que Portugal não é só praia».

Luis Baptista-Martins e Emanuel Brasil

Sobre o autor

Efigénia Marques

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