Região

A joalharia artesanal que toma parte no judaísmo de Belmonte

Escrito por Jornal O Interior

Claudio Bassani é joalheiro de profissão. Fabrica, de forma artesanal, joias de prata nas quais aplica pedras e ornamentos. Para breve está a inauguração da sua loja em Belmonte, local que escolheu para se fixar e desenvolver o seu negócio devido sobretudo à fé e cultura judaicas.

A pequena oficina denota a omnipresença do trabalho na vida deste artesão. Peças de metal, ferramentas e desenhos inundam o espaço, organizado de acordo com os diferentes processos de fabrico dos acessórios: de um lado derrete-se o metal, no outro lá estão as formas onde arrefece. À direita está a zona de martelar e de dar forma, à esquerda surgem as escovinhas de limpeza para polir. No canto da sala com mais luz, junto à janela, é possível observar as pinças e suportes que denunciam que este é o local onde os pormenores mais minunciosos ganham vida.
A manipulação do metal sempre foi uma presença constante na vida de Claudio Bassani, italiano radicado em Belmonte. O domínio do ofício de joalheiro resulta da amálgama de influências e vivências que colecionou ao longo da vida. «De início não percebia nada. Martelava os dedos e cortava as mãos nas primeiras vezes que fiz algo sozinho. Mas queria tanto aprender que acabei por incorporar as técnicas ao longo dos anos, fruto de muito do trabalho que tive em fábricas e da experiência que fui acumulando em vários países», adianta. É um artesão completo: idealiza, desenha, executa e aperfeiçoa as suas peças. «É um pouco como acontece com os pintores. Antes de pintarem já têm na cabeça a imagem do quadro final», explica o artista.
A crença judaica reflete-se no seu ofício, pois o artífice incorpora nas peças elementos religiosos e reintrepreta-os em pormenores. «Trabalho elementos judaicos, como a estrela de David ou crucifixos, mas também faço trabalhos mais clássicos. Acho que faço um pouco o casamento do gosto médio-oriental com o ocidente», explica o joalheiro. Na sua oficina produz sobretudo anéis, colares e pulseiras em prata. A forma é o elemento mais trabalhado pelo artesão, que também aplica pedras preciosas e semi-preciosas nalgumas das peças. A influência das várias culturas que vivenciou é, na sua opinião, aquilo que o distingue no seu trabalho: «Ter estado em tantos países com culturas tão distintas fez com que contactasse com várias estéticas e penso que isso se reflete nas minhas joias», afirma.
Membro recente da comunidade judaica belmontense, Claudio Bassani está grato por esta possibilidade e espera um dia poder retribuir a oportunidade. «Não faço o que faço para enriquecer, tenho sempre em mente a população. Sem dúvida que gostaria de contribuir para a comunidade que me acolhe, por isso acho que ensinar futuros artesãos poderia ser uma boa forma de retribuir», justifica. Instalado e integrado, o próximo passo é oficializar a abertura da sua loja para poder iniciar o contacto directo com o público. «Estou apenas a aguardar a carta da Casa da Moeda para abrir portas oficialmente», explica o artesão, enquanto mostra o espaço já destinado à concretização do negócio.

A história de vida e o percurso de aprendizagem

Claudio Bassani nasceu em Mântua, uma comuna italiana da região da Lombardia, em 1964. Em tenra idade foi enviado para Valenza, no Piemonte, onde estudava de manhã e trabalhava à tarde.
«Ali vivi praticamente sozinho, com outros miúdos da minha idade, num ambiente onde estudávamos as matérias tradicionais de manhã e aprendíamos um ofício à tarde», recorda. Os pais cedo incutiram no filho o sentido de responsabilidade e os valores do trabalho «Na cultura judaica desde cedo que as famílias encaminham os filhos para o trabalho de forma a ganharem independência», afirma o joalheiro, gesticulando com os dedos negros e calejados de martelar o metal.
Em Itália, trabalhou em diversas fábricas, todas ligadas a manipulação de metal, embora os negócios divergissem. Aí foi vendo e aprendendo as técnicas de quem sabia. «Foi nesta altura que aprendi bastante, pois mudava de fábrica frequentemente. Fui aprendendo, por observação, diferentes técnicas que hoje me permitem manipular facilmente a prata para criar joias», sublinha, sorridente e orgulhoso por ter adquirido o perfecionismo por tentativa-erro.
Em 1986, após a graduação militar, rumou a Israel. Tinha 19 anos, e «todos os sonhos do mundo», quando desembarca em Tel Aviv, onde foi somando empregos e experiências de vida. Trabalhou na inseminação artificial de peru, em hotéis, explorou outras zonas do país e acabou naquilo que sempre foi a sua vocação. Foi na bolsa de diamantes da cidade que se iniciou como operário até se tornar gerente de uma fábrica da especialidade. «Em 2005 regressei a Itália, onde abri a minha pequena fábrica. Em meados de 2007 o negócio começou a sofrer os efeitos da crise de emigração que se vivia e decidi ir trabalhar para o Brasil. Estive numa fábrica durante cerca de um ano e regressei», conta.
Mas o interesse pela língua portuguesa e a curiosidade por Portugal levou-o a embarcar em nova viagem, desta vez rumo a Faro, em 2011. «Cheguei como turista, mas fiquei encantado com a tranquilidade que se vive na cidade. Comecei a fazer algumas amizades, conheci um antiquário e expliquei-lhe o meu trabalho na área de bijuteria/ joalharia. Ele mostrou interesse e deu-me a oportunidade de ter a minha área de trabalho no seu estabelecimento», lembra. A venda de artigos em mercados locais permitiram-lhe confirmar o interesse do público no seu ofício. «As pessoas apreciavam o meu trabalho e por isso ponderei estruturar um negócio mais sério. Belmonte interessou-me pela forte ligação ao judaísmo, a minha religião. Resolvi mudar-me para cá e por aqui continuo», conclui Claudio Bassani.

Sobre o autor

Jornal O Interior

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