Ventos de mudança

“Sérgio Costa conquistou o concelho, calcorreando todos os lugares, ouvindo e falando com as pessoas.”

As eleições autárquicas do passado domingo confirmaram que este é o mais vibrante período do calendário político.
A nível nacional, o PS ganhou as eleições autárquicas, teve mais eleitos e mais câmaras, mas foi o PSD que ganhou um novo ânimo: recuperou autarquias e ganhou em cidades como Lisboa, Coimbra, Portalegre ou Funchal. A política não vive apenas de resultados absolutos, vive também de interpretações, de sensações e perceções. E a perceção é a de que com estes resultados, mesmo ganhando formalmente, o PS está em fim de ciclo.
Na região também se sentiu que o PS está em queda. O PSD passou a ter oito autarquias no distrito da Guarda, com vitórias notáveis em Figueira de Castelo Rodrigo e Mêda, mas também em Foz Côa, Almeida, Pinhel, Sabugal, Celorico da Beira e Gouveia. Por isso, as bases já se movimentam e a liderança do PS distrital de Alexandre Lote e Ana Mendes Godinho vai ser questionada.
Na capital de distrito o PSD perdeu a Câmara com estrondo para Sérgio Costa. O movimento “Pela Guarda” fez um trabalho profícuo, ouvindo as pessoas, num porta-a-porta constante, que outros não quiseram fazer (ou não souberam). A noite eleitoral surpreendeu, em especial os mais distraídos, e desde logo os que na sede do PSD nunca ouviram os sinais que chegavam de todos os lados– Chaves Monteiro perdeu as eleições no dia em que recusou aliar-se ao CDS (650 votos que agora lhe dariam a vitória) e Sérgio Costa iniciou a vitória no dia em que recusou a aliança ao mesmo CDS (ao ter a ousadia de se candidatar sem as amarras de partidos ganhou votos ao PS, conquistou eleitores pela coragem – são os audazes que mudam o curso da história). No debate organizado pela Rádio Altitude e O INTERIOR, enquanto outros estavam preocupados com a forma em vez do conteúdo, com ter mais uns minutos para falar do passado em vez de falarem do futuro, com Chaves Monteiro a querer justificar tudo e a irritar-se com pouco, Sérgio Costa simples, como futuro presidente, falou ao coração das pessoas sobre juntar os guardenses numa causa comum, cimentando um ambiente ganhador.
No O INTERIOR de 2 de setembro, escrevi aqui (https://ointerior.pt/opiniao/promessas-eleitorais/) que «quando entramos no período que conta em relação às autárquicas, a candidatura independente de Sérgio Costa vai agregando descontentes, não apenas originários de um PSD dividido, mas também originários do eleitorado de um PS que não consegue sarar feridas; Chaves Monteiro continua inebriado pelo poder e pela sondagem que lhe dava maioria (em junho), sozinho ou mal-acompanhado, com uma Assembleia Municipal marcada para dia 9 onde os adversários o irão trucidar, mas com a vantagem dos créditos conquistados e a assertividade de decisões e da boa governança; e o PS continua à espera que os apoios nacionais e o “perfume” de António Costa lhe bastem para manter os votos de 2017 (…), a Guarda poderá tornar-se ingovernável, com um 3-2-2 no executivo, dependente de negociações e acordos». Fui então criticado por muitos que achavam impossível esse cenário. Mas se no final de agosto ainda achava que poderia haver algum ascendente do PSD – pressentia que nas semanas seguintes isso poderia mudar, entre a Assembleia Municipal, onde um Chaves Monteiro enfurecido foi trucidado, e o debate do TMG – nos últimos dias de campanha a candidatura do PSD, surda e cega, incompetente e sem estratégia, isolou-se entre as quatro paredes da sede e os Paços de Concelho por não serem «testemunhas de Jeová a bater às portas das pessoas» (cito um dos candidatos do PSD). Foi assim que Sérgio Costa conquistou o concelho, calcorreando todos os lugares, ouvindo e falando com as pessoas – as campanhas sempre foram isso, ainda que por vezes pareçam outra coisa.
Com 3-3-1, Sérgio Costa terá agora de optar por governar sozinho e negociando pontualmente os apoios que precisará (nomeadamente para aprovar o orçamento, o que não será difícil pois poderá recuperar a ligação ao PSD…) ou fazer acordo com Luís Couto (perspicaz, Ana Mendes Godinho cedo foi dar os parabéns ao novo presidente da Câmara começando logo ali uma aproximação que poderá ser determinante para o futuro…) ou mesmo entregar algum pelouro ao PSD (por exemplo a Cultura a Victor Amaral). O novo presidente da Câmara da Guarda não terá a vida facilitada até porque Chaves Monteiro irá segui-lo até à exaustão, mas o apoio popular “veio para ficar”, se o mais difícil foi ganhar, esperemos para ver que futuro nos traz este vento de mudança. Glória aos vencedores e honra aos vencidos!

Sobre o autor

Luís Baptista-Martins

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