Todos os outros dias menos à 5ª feira

Escrito por Albino Bárbara

1 – Adolf Hitler ganhou as eleições de 1932. Conseguiu ser designado chanceler em janeiro de 1933, declarando, meio ano depois, que o seu partido era único, numa Alemanha até aí democrática. O discurso populista fez com que entre os seus eleitores houvesse de tudo. Os de convicção e os de ocasião. Os que acreditavam na sua pérfida ideologia, os que apostaram por apostar, alguns oriundos de outras forças políticas e ainda aqueles que queriam a mudança prometida.
Das eleições brasileiras teremos forçosamente de tirar algumas ilações.
O presidente eleito limitou-se a debitar alguns chavões populares, lugar-comum de uma mediocridade sem limites, não participou em debates porque efetivamente não tem ideias. Exceção quando afirma que vai diminuir os impostos aos mais ricos, (os mercados gostam disso), privatizar conquistas sociais, explorar ainda mais a Amazónia, colocar generais de índole duvidosa como ministros, amigos próximos e família em lugar de destaque, dar toda a força à polícia (essa mesmo que mais mata no mundo), vociferando violentamente contra as minorias, porque quanto ao resto, quanto aos costumes disse zero. Para o tal discurso populista, fácil de fazer e absorver pelos mais incautos, contribuiu a recessão de 2015, a completa incapacidade de Dilma para fazer reformas. A crise do “impeachment”. O fracasso completo do oportunista Temer e isto sem esquecer todo o processo de corrupção do “Lava Jato” que levou Lula à cadeia. No dia da vitória o presidente eleito (quase) deu o dito por não dito, apregoa agora todas as liberdades, é embaixador dos grandes valores e da democracia. Temos homem. Bolsonaro é indiscutivelmente o verdadeiro lobo com pele de cordeiro.
Não nos bastava já a crise nalguns países da América Latina para vermos agora um perigoso retrocesso civilizacional naquele que é o maior país da América Latina, o quinto em todo mundo e a 10ª economia mundial na terra de Pedro Álvares Cabral e na pátria de D. Pedro.
2 – Com uma mão cheia de nada o interior tem neste Orçamento de Estado de 2019 falhas múltiplas mesmo percebendo que existe a tal coesão nacional à qual puseram também o pomposo nome de Valorização do Interior e aqui, socorrendo-nos da bendita sabedoria popular, sempre diremos: “Bem prega Frei Tomás…”
A discriminação positiva e o incremento de medidas nem vê-las. Que é feito do desconto significativo no IRS para os residentes no interior? Onde estão os incentivos para os novos residentes, nomeadamente a isenção do IMI por 10 anos? Como se apoia o investimento se não houver redução do IRC para as empresas instaladas ou a instalar, beneficiando assim quem cria emprego? E a educação e o investimento na saúde? E a redução no preço da água e da eletricidade? E os transportes e as portagens? Afinal como é? E a pergunta é inevitável:
O que ganha o interior com este OE para 2019?
3 – Se assim é, que dizer das reformas antecipadas e a baralhação que, pelos vistos, só interessa ao Governo. Se bem se entende, a reforma por inteiro é apenas para aqueles que têm 46 anos de serviço e se inscreveram em qualquer subsistema de Segurança Social aos 14 anos. Depois vêm os que completam 60 anos de idade e 40 de descontos. Assim, tanto para uns como para outros, o fator de sustentabilidade desaparece para se perceber que em ambos os casos existem cada vez menos contribuintes a preencherem estes requisitos.
Todos os outros, os que tenham mais de 60 anos e mais de 40 de desconto, não poderão pedir a reforma antecipada por falta de tempo de serviço e idade. Exemplificando: Uma pessoa com 63 anos de idade e 42 anos de desconto leva uma penalização de 35%. Recorde-se que aqui conta a idade. A reforma completa está em 2019 nos 66 anos e 5 meses (penalização de 0,5%/mês) a que se soma o fator sustentabilidade. (14,5%).
Compreende-se que a reforma antecipada deva sofrer cortes, mas, tendo em conta que o trabalhador entra para o mercado de trabalho cada vez mais tarde, as reformas antecipadas são uma autêntica balela para inglês ver, não seguem o princípio de igualdade, sendo apenas mais uma habilidade chica-esperta de um Governo que, também nesta matéria, é o perfeito mestre da ilusão.
4 – Todos os dias, menos à quinta-feira, é um assunto deveras interessante, discreto por indiscrição.
Sempre me disseram que as conversas de Estado eram tratadas à porta fechada, longe das câmaras, dos holofotes e dos jornalistas. Percebe-se agora que quando se está tempo de mais no poder coisas destas podem acontecer. E pelos vistos acontecem. É talvez por isso que o mercado do Bolhão foi transferido e algumas peixeiras de Boliqueime têm posturas de verdadeiras senhoras de pregão consistente e delicado… e Molly Malone morreu deixando definitivamente o seu carrinho de mão entre amêijoas e mexilhões…

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Albino Bárbara

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