Tinta vermelha

“Em Portugal, ficou agora óbvio quem é que tem a régua, o esquadro e a lapiseira. Depois de sobreviver ligado a uma geringonça com as extremas-esquerdas (“derrubar muros”, disseram eles), o PS desenhou a linha e construiu a parede para que o PSD nem sonhasse com uma traquitana com a extrema-direita. “

Nos últimos anos, a política portuguesa e europeia popularizou uma expressão, “linhas vermelhas”. Pensava-se que a cor encarnada dessa demarcação se devia à coloração arbitrária que significa proibição, como se convencionou nas regras de trânsito. Mas, na verdade, percebe-se agora que essas linhas são vermelhas porque é a cor que (auto)identifica as esquerdas, sejam as parlamentares, sejam as para lamentar.
Em Portugal, ficou agora óbvio quem é que tem a régua, o esquadro e a lapiseira. Depois de sobreviver ligado a uma geringonça com as extremas-esquerdas (“derrubar muros”, disseram eles), o PS desenhou a linha e construiu a parede para que o PSD nem sonhasse com uma traquitana com a extrema-direita. O horror socialista aos populismos do continente é acompanhado com um acordo com populistas da Madeira. Na esquerda ninguém rasga vestes pelo apoio de Orbán a António Costa, mas o apoio de Meloni a Van der Leyen é o fim do mundo em cuecas.
Em tempos, assinei um manifesto onde várias pessoas que não são de esquerda consideravam preferível que a direita moderada não fizesse acordos com a direita radical. Mantenho essa preferência. Se me perguntassem – e ninguém quer saber a minha resposta – prefiro acordos ao centro a entendimentos aos extremos. O que me encanita um bocadinho é que a política de entendimentos seja sempre decidida pelas vozes bem-falantes da esquerda contra os tenebrosos e sombrios propósitos do mundo não-progressista.
Bem sabemos que a esquerda é sempre cheia de virtudes, sempre atenta ao discurso de ódio de quem faz apartes sobre a preguiça dos outros. Talvez por estar sempre vigilante ao que possa dizer qualquer pateta da extrema-direita, não havia observadores dessa polícia da linguagem suficientes para terem dado conta de um ajuntamento que se entretinha a perseguir pessoas com gritos de “assassinos”, só pelo facto de terem participado na cerimónia que assinalava o aniversário da independência de Israel. Pelos critérios que ouvi os partidos de esquerda defender no parlamento, isto deve ser discurso de ódio.
Tenho defendido em vários locais que a liberdade de expressão serve até para isso. A esquerda que está no parlamento e naquele ajuntamento é que não.

* O autor escreve de acordo com a antiga ortografia

Sobre o autor

Nuno Amaral Jerónimo

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