Sportinguizo

“Um benfiquista compra o cachecol de campeão da época seguinte em Julho, antes de o campeonato começar. Um sportinguista tem um de 1979, porque sabe que o vai usar pouco, e mesmo assim, no fim-de-semana em que o avanço é já de 7 pontos, vai para fora sem o adereço verde e branco porque de certeza que aquilo ainda pode correr mal.”

Começa-se esta semana com uma informação ligeiramente atrasada, mas ainda assim actual e factual: o Sporting foi campeão nacional de futebol masculino. E com outra mais fresca: o Sporting foi campeão europeu de hóquei em patins masculino.
Para um verdadeiro sportinguista, estes dois acontecimentos no espaço de uma semana são uma perigosa overdose de títulos. É provável que benfiquistas e portistas não entendam as linhas que se seguem, pelo que se aconselha prudência na continuação da leitura.
Um sportinguista não sonha ganhar sempre. Sonha ganhar, um dia. No futuro. Quando acontece mesmo, festeja-se com a surpresa e a sofreguidão de quem imagina que só voltará a fazê-lo dali a muitos anos. Pessoalmente, estou preparado para só voltar a festejar lá para 2040.
Durante muitos anos, os benfiquistas achavam que gozavam com os sportinguistas dizendo-lhes, ironicamente, “Este ano é que é”. Durante todos esses anos, os encarnadinhos nunca entenderam que essa piada era sobre eles e sobre a forma esperançosa como vêem o mundo.
Há uma condição fatalista, trágica e pessimista no sportinguismo – e é isso que nos atrai, não o que nos afasta – que adeptos de “clubes grandes” nunca poderão entender. Nem a nós nos apetece explicar.
Todos os anos que um benfiquista me dizia sarcasticamente, “este ano é que é”, querendo dizer “não tenhas ilusões, que ainda não vai ser este ano”, a minha resposta era um encolher de ombros significando, “mas nem eu espero que seja”.
Um benfiquista compra o cachecol de campeão da época seguinte em Julho, antes de o campeonato começar. Um sportinguista tem um de 1979, porque sabe que o vai usar pouco, e mesmo assim, no fim-de-semana em que o avanço é já de 7 pontos, vai para fora sem o adereço verde e branco porque de certeza que aquilo ainda pode correr mal.
A melhor época de sempre do Sporting num campeonato de futebol acabou com a equipa em 2º lugar. Não por acaso, o feito foi alcançado por um sportinguista de alma e coração, Jorge Jesus. Isso é sportinguismo. Ser o melhor e não ganhar.
Tinha de ser um benfiquista, Ruben Amorim, a vir agora para o Sporting estragar a mística leonina. Ganhar tudo, ganhar sempre, ganhar outra vez. Não é essa a identidade do meu clube. Qualquer dia, o Sporting está tão estragado como o Manchester City, um clube simpático que não ganhava nada, e que agora até uma Liga dos Campeões já tem na sala dos troféus.

* O autor escreve de acordo com a antiga ortografia

Sobre o autor

Nuno Amaral Jerónimo

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