Soares, o cidadão do mundo

Mário Soares nasceu há 100 anos!

Figura maior da democracia portuguesa, Mário Soares nasceu em Lisboa, a 7 de dezembro de 1924, há 100 anos.

Foi advogado de causas perdidas, as causas daqueles que lutavam contra a ditadura, tendo sido defensor de muitos opositores do regime salazarista. Participou ativamente nas candidaturas de oposição dos generais Norton de Matos e Humberto Delgado à Presidência da República.

Mário Soares foi anticolonialista, e desenvolveu uma ativa campanha de denúncia da situação política portuguesa, particularmente contra a Guerra Colonial

Em 1973, na cidade alemã de Bad Munstereifel, fundou o Partido Socialista (PS), de que viria a ser secretário geral durante quase treze anos.

Após o 25 de abril, Mário Soares foi o primeiro exilado político a chegar a Portugal após o derrube da ditadura, a 28 de abril de 1974, viajando de comboio entrou em Portugal pela fronteira de Vilar Formoso. Atrás de si, tinha um passado de luta e oposição à ditadura. À sua frente, esperava-lhe um papel determinante na transição e institucionalização da democracia portuguesa.

Foi um dos protagonistas do 25 de novembro opondo-se à unicidade sindical e à instalação de um regime totalitário comunista e notabilizou-se na defesa da liberdade de imprensa. Um ano depois, em abril de 1976, votou a Constituição democrática portuguesa.

Europeísta convicto, Mário Soares encarou desde sempre a integração de Portugal no projeto europeu como um desígnio nacional e uma condição indispensável para a construção de um país verdadeiramente livre, aberto e moderno. Foi Primeiro-Ministro de três governos constitucionais (1976-1977; 1978; 1983-1985), e liderou o processo de adesão de Portugal às Comunidades Europeias.

Em março de 1986, tornou-se o primeiro civil eleito por sufrágio universal direto para o cargo de Presidente da República – Mário Soares foi o primeiro Presidente civil, após seis décadas de Presidentes da República militares, trazendo consigo um projeto de futuro e de modernidade para o país. Exerceu a Chefia do Estado durante dois mandatos (1986-1996), adotando um estilo novo de presidência: como o “presidente de todos os portugueses”. Inaugurou o tempo da presidência aberta e a quarta foi na Guarda (de 25 a 31 de março de 1988).

Após o fim do seu segundo mandato presidencial, Soares continuou a assumir uma ativa intervenção política, social e cultural. Foi deputado europeu e, em 2006, concorreu, de novo, à Presidência da República, tendo perdido as eleições.

O seu longo percurso político, quer durante os mais de trinta e dois anos de resistência permanente à ditadura, quer na visão e atuação que demonstrou nos cargos políticos e governativos que desempenhou após o 25 de Abril, tornaram Mário Soares uma voz escutada a nível mundial. Fica para a história como o rosto do Portugal Democrático.

Como curiosidade, referir que o pai de Mário Soares foi João Lopes Soares, que nos alvores da República foi administrador do concelho da Guarda e depois Governador Civil do Distrito da Guarda, em 1912. Na toponímia da cidade encontramos o Largo João Lopes Soares frente à escola de Santa Clara.

Mário Soares nunca foi um homem de consensos, mas foi um democrata de grande coragem e visão. Ele era o “bochechas” aristocrático, bem-humorado e bom conversador, curioso e culto, que antecipou como ninguém o futuro de Portugal. Como escreveu Miguel Esteves Cardoso, que o chamou de «encantador de serpentes» no Público de hoje, asseverando que «nunca fizeram tanta falta pessoas modernas, civilizadas, cultas, vividas, bonacheironas, descaradamente burguesas, mas altruístas e justas e conscientes de todos os privilégios. Mas não é no plural que se deve falar, quando se fala de Mário Soares. Ele era singular. E é ele que faz falta».

«Soares é fixe» cantou-se em Foz Côa quando as gravuras não sabiam nadar e era «fixe» porque «Soares era um gajo porreiro e um senhor, até porque um senhor é sempre um gajo porreiro. Nunca fizeram tanta falta os gajos porreiros, os que estão bem com toda a gente, os que aceitam que os outros sejam como são, os que se riem em vez de chorar». E é essa a memória que tenho, que temos, que todos temos de Mário Soares. Mesmo aqueles que não gostaram de Soares. Mesmo aqueles que atacaram Soares. Mesmo esses reconhecem a sua coragem, categoria e perspicácia. E mesmo esses, os que ainda vivem, ao olharem para trás reconhecem e percebem a ímpar e extraordinária personalidade que foi Mário Soares.

Se fosse vivo, Mário Soares teria completado 100 anos. Foi a maior referência política dos últimos 50 anos.

Foto: Fundação Mário Soares e Maria Barroso

Luís Baptista-Martins

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