Sempre imaginei o paraíso como uma biblioteca

Na sua crónica diária no Público, hoje, Miguel Esteves Cardoso conduz-nos à Livraria Campos Trindade, em Lisboa. E é ali que regresso enquanto leio a crónica. E era ali que regressava tantas vezes nas minhas visitas por Lisboa. Foi ali que procurei livros de autores menos conhecidos e pequenas editoras quando organizava a Feira do Livro da Guarda, nos idos de 2001, 2002, 2003, 2004 e 2008.

Foi naquela livraria, na Rua do Alecrim, que pela primeira vez li uma das mais marcantes frases da minha vida: “Sempre imaginei o paraíso como uma grande biblioteca”, de Jorge Luís Borges – que depois seria adotada como uma “assinatura” da própria livraria.

Razões suficientes para ficar inquieto quando leio que também a Campos Trindade pode fechar… Ou que vai renascer, para ser outra coisa, talvez com livros e com a alma de sempre, a alma que o senhor Tarcísio lhe impregnou.

O fecho de livrarias e o desaparecimento de alfarrabistas são o mais doloroso destes tempos em que a sociedade digital (e a pandemia) passa por cima da alegria de mexer num livro, de sentir o prazer da companhia de uma obra, de beber as palavras que alguém nos legou, de voar nas asas de cada página, de ler e viver cada capítulo, cada frase, cada expressão.

Ler um livro em papel, tocá-lo, folheá-lo, guardá-lo ou oferecê-lo, é um prazer que fica para sempre. E um sentir que jamais algum devir pode diminuir.

Por isso, quando lamento que no interior, e na Guarda onde vivo, haja poucas livrarias e cada vez menos feiras onde possamos passear por entre as mais diversas obras, fico perplexo que em Lisboa também desapareçam tantos lugares míticos e casas de cultura e do livro. Porque se compreendo (compreendo?) que nas nossas vilas e pequenas cidades não haja pessoas suficientes para alimentar o sonho e o prazer de dar vida a livrarias e alfarrabistas, não consigo perceber que nas grandes cidades o mundo digital e os ebooks substituam tão facilmente o imenso prazer de viver no meio de livros e destruam um negócio essencial e um mundo tão bonito como o das editoras de livros e as lojas encantadoras onde se vendem.

Ler é saber mais, mesmo. Por isso, entre jornais e livros, confinados pela pandemia, ler «é o melhor remédio».

 

 

Sobre o autor

Luís Baptista-Martins

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