Excecional este nosso tempo. Ainda não digerimos condignamente o primeiro retrato do Buraco Negro, que fica a 50 milhões de luz de distância, e já nos dizem como devem ser processadas as pensões de reforma daqui a 5 anos. Para fotografar o Buraco foram precisos 200 cientistas, para retratar o futuro, não sei quantos foram. O que, na minha perspetiva, é grave, porque a diferença entre o que resulta da conjugação do esforço de duas centenas de cérebros não terá nada a ver com o que resulta de meia dúzia de cabecinhas pensadoras. Infelizmente, parece-me, os cérebros vivem todos mais interessados nos céus do que em nós, simples mortais à mercê de pensadores de um catálogo muito antigo.
No caso das pensões para daqui a 5 anos, penso que alguém muito precisado de calar as muitas gentes que, aqui e ali, se vão insurgindo contra os parcos rendimentos, face aos faustos de uns poucos, se terá lembrado de passar os olhos pelo índice. Quando chegou ao que lhe servia, não resistiu a encomendar logo um “Estás a refilar? Anda que já te calo”. Uma narrativa bem urdida é assim, tem o dom de substituir a realidade por conceitos alternativos sem que a maioria se aperceba. Quando damos por nós, estamos envolvidos pela convicção da nossa inferioridade e mesquinhez. “Ah! Pronto se é melhor prevenir, não me importo.” Cheios de remorsos até aos cabelos. “Eu não sabia, nem me tinha ocorrido.” Por essas alturas já os pensadores por encomenda estão a receber gratificações e honrarias e, mesmo que a coisa vire, já ninguém lhas tira. Não importa se daqui a 5 anos ainda cá andaremos, ou se outros modelos sociais e económicos, entretanto, se inventem, o que importa é moldar a turba desde já.
Também não interessa se o fenómeno, em si, foi testado ou sequer devidamente estudado. O que importa é aniquilar qualquer reação ao mesmo e nisso, pensadores e patrocinadores, são peritos. Basta atentar nos Movimentos, Fundações, Associações e outros imprescindíveis que tais que todos eles carregam no currículo. A utilidade disso tudo para cada um de nós é que já não publicitam, nem a ferros. Coisa que, a bem da transparência e da hombridade deveríamos exigir. Ah! Fundou um Movimento, apresentou-o a toda a gente e depois? Ah! Fundou uma Associação, apresentou-a a toda a gente e depois? Ah! Deu condições para se instalarem não sei quantas empresas e depois? Se calhar, obrigávamo-los a confessar que depois, nada. O Movimento era só para entreter, a Fundação para disfarçar e a Associação para inglês ver. Entreter os crédulos, disfarçar mais valias e enganar os incautos, já se vê! Uns e outros hão de, com uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma, alcandorar estas cabecinhas pensadoras a palcos mais vastos.
Enquanto isso, o mundo pula e avança impulsionado por cérebros que, contra tudo e para mal dos nossos pecados, teimam em olhar para o céu. Criando (do mal o menos) novas perspetivas de nós próprios, substituindo a nossa convicção, induzida, de pequenez perante os homens, pela da nossa insignificância, efetiva, perante o universo.