Para nada?

Escrito por António Ferreira

“A verdade é que a taxa de mortalidade do vírus parece ter baixado: apesar de haver mais mortes, há muitos mais infetados e muitos mais testes.”

Perante os números das últimas semanas, parece não terem valido de nada os sacrifícios que fizemos durante a primeira vaga da pandemia. Há mais infeções, mais hospitalizações, mais mortes, e nem sequer começou ainda a sério a época da gripe. É por isso fácil dizermos agora que mais valia ter prolongado pelo Verão o confinamento da Primavera, até termos exterminado de vez o vírus.

Não é assim. Em primeiro lugar, neste mundo de fronteiras abertas ninguém está livre de uma segunda vaga devastadora, seja na Nova Zelândia, uma ilha, seja entre nós. A não ser que quisessem que nos fechássemos ao mundo, assim matando de vez a nossa indústria do turismo e mesmo assim sem resultados garantidos. Depois, o primeiro confinamento serviu para ganhar tempo enquanto melhoravam as terapias e se aproxima o momento em que serão disponibilizadas as várias vacinas em condições de chegar em segurança ao mercado. A verdade é que a taxa de mortalidade do vírus parece ter baixado: apesar de haver mais mortes, há muitos mais infetados e muitos mais testes. Finalmente, permitiu o então célebre e agora esquecido “achatar da curva”, e sem ele teríamos esgotado a capacidade do Sistema Nacional de Saúde.

É claro que o estado em que estamos agora mostra que mesmo com esses sucessos a coisa não correu bem. De quem é a culpa? É claro que é do Estado, mas o Estado somos todos nós, incluindo os que estiveram em Fátima, na Festa do Avante, na Nazaré, em Portimão ou em todos os casamentos, batizados, feiras e festas destes últimos meses.

Aprendemos muitas coisas desde o início da pandemia: o vírus não se cura injetando lixívia; a hidroxicloroquina não é o remédio mágico; os corticoides ajudam, as máscaras também; o Remdesivir talvez; as missas e ladainhas ajudam pouco, ou nada. Outras coisas já sabíamos e continuam válidas, como a necessidade do distanciamento social, do uso generalizado de máscaras, da higiene respiratória e, sim, que é recomendável utilizar a app Stayaway Covid. Outras começam a ser mais claras: o vírus é mais contagioso do que se pensava; uma grande parte dos infetados são assintomáticos, e isto cria uma falsa sensação de segurança, ou de que o vírus “não é tão perigoso assim”; muitos dos que sobreviveram ao vírus vão ter sequelas graves para o resto da vida.

Estamos agora muito mais perto de uma vacina ou de um tratamento eficaz. Serão meses, ou um ano, e estará disponível. Vai haver outros desafios, na sua produção e distribuição, mas esse será um problema mais simples de resolver.

Por isso, não foi para nada que tivemos de nos fechar em casa e não o será se tivermos de nos fechar outra vez. Entretanto, muito dependerá do nosso civismo e inteligência, e fazem tanta falta como uma boa vacina.

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António Ferreira

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