Os Verões que aí vêm

Escrito por António Ferreira

“É tudo tão fácil e tão difícil: basta eliminar o causador dos males para aliviar os sintomas, mas há uma montanha de obstáculos a desviar primeiro do caminho.”

O IPMA lançou um alerta vermelho de tempo quente para os dias 12 e 13 de julho. As temperaturas esperadas para a Guarda começam em 22º (mínima) e vão até 36º (máxima). Para quinta, com mero alerta laranja, a mínima prevista é de 25º e a máxima de 38º. Não entendo a lógica dos alertas, mas admito que está mesmo quente, e em muitos sítios muito mais que na Guarda: em Idanha-a-Nova vai ser uma semana inteira acima dos 40º, como em Santarém, Castelo Branco, ou Évora.
Se tivesse chovido mais no Inverno e as barragens e aquíferos estivessem no nível máximo, não seria tão mau. Piora a situação o sabermos que a partir daqui vai ser assim: seca e vagas de calor, cada vez piores; entre maio e outubro de cada ano, Invernos curtos e pouco chuvosos.
Sabemos há muito das alterações climáticas e do que é preciso fazer para lhes contrariar os efeitos. Temos de reduzir quanto pudermos as emissões de gases com efeito de estufa, orientar a economia e as nossas vidas para um futuro sem combustíveis fósseis, menos consumo industrial, menos carne. No fundo, temos de aceitar que vamos ter uma vida mais difícil. Muito mais difícil.
Talvez seja ainda mais difícil do que o previsto, mas não nos dizem. A atual prosperidade, ou aquilo a que chamamos prosperidade, é devida à exploração do petróleo. Os adubos químicos, alguns medicamentos, os plásticos, os combustíveis baratos e abundantes e a facilitação dos transportes permitiram às economias mundiais um crescimento sem precedentes.
É sabido que o combate às alterações climáticas nos vai obrigar a abdicar de muito do que foi conseguido em progresso e qualidade de vida. Descarbonizar e manter o crescimento é impossível, e será também impossível manter o atual nível de vida. Aos países do terceiro mundo, à espera de acederem por sua vez ao progresso e ao desenvolvimento, terá de se dizer que ainda não é desta.
É claro que há outra solução, seguida por muitos, de Trump a Bolsonaro, dos republicanos mais radicais dos EUA a todos aqueles que negam as alterações climáticas: não fazer nada, esperar que este fenómeno, que julgam passageiro, chegue ao seu fim natural. Entretanto, há que abrir mais explorações de petróleo e gás natural, cortar mais árvores na Amazónia, plantar mais olivais super-intensivos que iremos irrigar com a água que por agora começa a faltar, mas irá certamente regressar, mais tarde ou mais cedo.
Parece uma questão polémica, em que podem ter razão uns e outros, mas de um lado temos milhares de cientistas e do outro o Bolsonaro e gente do seu calibre intelectual. Não deveria por isso ser difícil distinguir o lado que fala a verdade, nem que seja pela nossa própria experiência.
A pandemia mostrou-nos como a redução da atividade industrial e o confinamento da nossa espécie deram um significativo alívio à natureza. As águas e o ar ficaram mais limpos, o aquecimento global desacelerou. Foi por muito pouco tempo, mas foi possível ver que pode não ser tão difícil assim reverter algum do mal já feito.
A guerra, por sua vez, mostrou como vai ser difícil vivermos sem combustíveis fósseis. Os alemães, apesar da violência do Verão, tiritam já com a possibilidade de os russos cortarem no próximo Inverno o fornecimento de gás natural.
É tudo tão fácil e tão difícil: basta eliminar o causador dos males para aliviar os sintomas, mas há uma montanha de obstáculos a desviar primeiro do caminho.

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António Ferreira

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