Os novos fascistas

Escrito por Diogo Cabrita

«Os novos fascistas são os vigilantes da Internet. Os novos pides correm atrás do pensamento alheio e insultam, vilipendiam, acicatam, formam matilhas de perseguidores.»

Há tipos que trabalham ininterruptamente, sem vacilar, não lhes conhecemos fraquezas. Há pessoas que têm uma imaginação inacreditável. Há pessoas com vários vícios e outras sem nenhum. Há pobreza e há luxúria e em todas elas encontramos adaptados e suicidas. Há tipos premeditados, há gente genuína. A diversidade da nossa espécie é em si própria a maravilha da diferença. A vaidade de alguns contrasta com a infinita modéstia de outros. A necessidade de recato confronta-se com a alergia ao anonimato. A natureza tolera todas as subtilezas que distinguem animais e comportamentos. Os novos fascistas são os vigilantes da Internet. Os novos pides correm atrás do pensamento alheio e insultam, vilipendiam, acicatam, formam matilhas de perseguidores. O que me espanta é serem da velha esquerda, a estrutura que defendia a liberdade, que se erguia contra a intolerância. Hoje, alguns destes cidadãos encheram as veias de certezas, de convicções imobilistas. Não perceber que todas as convicções são incertas até prova em contrário é desde logo uma falha para a excelência. Um escritor vaidoso, de convicções científicas, com a missão de divulgar verdades imutáveis (upss – desde logo endeusamento) pode estar nos holofotes com facilidade. A doença maior dos vaidosos é a cegueira e por essa razão convertem-se em fanáticos persecutórios contra o pensamento alheio.

A sede com que um entrevistado recente do “Expresso” mordia, dilacerava a dose mínima farmacológica, é quase doentia. Nos anos 90 a anestesia tumescente de Klein comprovou que a dosagem de 20 cc de lidocaína em mil cc de soro frio e uma ampola de adrenalina permitiam a realização de cirurgia estética em áreas extensas (lipoaspiração abdominal), de impossível capacidade a quem recorresse apenas aos frasquinhos de lidocaína a 1%. 40 cc desse fármaco tinham riscos de toxicidade, mas utilizando a sua diluição e um fármaco que impedia a sua absorção rápida estávamos no domínio da desconstrução do passado. Agora era viável fazer lipoaspiração sem anestesia geral. Lembro textos violentos da especialidade de cirurgia plástica contra os da medicina estética. Uns fanáticos da têmpera do entrevistado levaram-me a juízo por usar esta diluição no Hospital da Guarda, em 1999, e receberam o contributo de uma ignara anestesista da Ordem dos Médicos que debitou documentos contra aquilo que hoje é uma evidência e uma certeza. O conhecimento tem uma evolução que pode ser aos saltos, em continuidade, em soluços, mas é fascinante porque é tudo possível.

Não percebo nada de homeopatia, mas tenho certezas sobre o improvável e o seu efeito surpreendente nos humanos. Tenho a certeza que podemos fazer muito melhor no futuro, fertilizando o conhecimento das ciências e utilizando novidades disruptivas em muito do que hoje temos como pilares. Tenho a certeza que muito do que hoje é norma no futuro será um disparate. Por isto vejo todos os fanáticos de modo igual. Não reconheço hoje esquerda e direita, mas reconheço um obcecado, empertigo-me contra todos os obstinados e os donos da comunicação social com palas.

Sobre o autor

Diogo Cabrita

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