Os idosos sós

Escrito por Diogo Cabrita

A moita de aço é lugar onde não caça o leão. A moita de espinhos não atrai predadores. Acantonado num lugar hostil, qualquer um que sobreviva escapa do ataque mais ou menos biselado. O problema é sobreviver na adversidade maior, conseguir salvar-se da tormenta mais brutal e depois comer um pratinho de tremoços a contar a aventura já distante. Sobram as memórias boas, as regas do ego, a flor que brota da salvação. Havias de ver! Eu fiz e aconteci! Gostávamos todos de ter uma moita de aço coberta de espinhos onde a porta era a nossa salvação. À chegada do ladrão corríamos para o quarto de pânico, refugiávamo-nos e pronto! A vida não tem quartos de pânico, tem por substituição medos, fugas, balbuciantes respostas, pernas titubeantes e figuras tristes que são a forma cobarde de enfrentarmos uma violência incomportável. Amochar é um ato de defesa que nos protege a vida. Urino-me nas calças. Liberto fezes. Perco os esfíncteres e envergonhado olho para o chão. A vítima nasce deste processo e nunca mais esquece, ou a violência ou a vergonha. Já o caso do atacante é mais doce. O agressor muitas vezes adormece a memória, esquece aquilo que fez passar, a brutalidade que cometeu. A moita de ferro protege disto tudo, mas não apaga o medo. Pode o coelho treinar karate que não vai ganhar ao puma.

A vida é assim: há predadores que espreitam as fraquezas dos mais fracos. Devoram-nos! Assim vejo os ladrões que andaram a enganar idosos sós pelos distritos de Setúbal e Porto. Predadores violentos.

Sobre o autor

Diogo Cabrita

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