O vitupério feito lugar comum

Escrito por Jorge Noutel

Esta semana faleceu Fernanda Lapa, uma mulher da cultura e da luta pela emancipação da mulher na vida social do país. Para além da recordação à sua memória, lembro-me de uma frase sua que pela sua acuidade nos devia merecer a maior e melhor das reflexões. Dizia Fernanda Lapa que «este país não é para artistas, nem para velhos, nem para novos». Face aos últimos acontecimentos, em época de “silly season”, não podia concordar em absoluto com a afirmação desta senhora da cultura. Não é para artistas dado que tivemos e temos um Ministério da Cultura que deixou cair para as ruas da miséria uma classe que, predominantemente, constituída por precários se viu, por causa da Covid-19, sem eira nem beira. E, durante meses, um Governo mais preocupado com o apoio aos empresários esqueceu os artistas, esqueceu a cultura. O Governo fez orelhas moucas aos gritos desesperantes de artistas e de todos os trabalhadores ligados ao sector da arte que estão sem trabalho, sem dinheiro, sem horizonte, sem esperança no futuro.

Realizaram-se vigílias pela cultura e pela arte e o Governo e Presidente da República calavam hipocritamente. Por fim vieram medidas paliativas que apenas empurram o problema com a barriga através de “medidas absurdas” impostas para a reabertura das salas de espetáculo, criando a certeza de um futuro incerto do sector das artes, a desesperança, frustração e falta de uma vida condigna dos atores e técnicos. Lembrando ainda Fernanda Lapa, «um país que não trata bem os artistas está moribundo». E está! Bem se sabe e conhece que aos poderosos não interessa que o povo se instrua, se emancipe pelo conhecimento. «Brutos vos quero»!

Quanto aos idosos soube-se esta semana, através de um relatório da Ordem dos Médicos, as razões que determinaram as perdas de vidas humanas num lar em Reguengos de Monsaraz. Não foi um qualquer organismo oficial que avançou com o inquérito foi a Ordem dos Médicos e só depois, face às graves acusações estampadas no relatório, é que o Ministério Público decidiu avançar com um inquérito. Revelador da hipocrisia que campeia nos arautos imundos da política. Falta de cuidados, não cumprimento das regras emanadas pela Direção-Geral da Saúde e agora, veio-se a saber, que muitas das mortes ocorridas se deveram à desidratação dos utentes do lar e à agudização de muitas das suas doenças. Para se perceber o grau de acefalia e de cumplicidade desta gente, lembrar que o presidente da Câmara de Reguengos de Monsaraz faz parte da direção da Fundação Maria Inácia Silva, proprietária do lar.

Perplexo o país ouve e cala. Assiste às sucessivas e pacóvias selfies, sorrisos impostores e a muita conversa da treta. Quem pode explicar uma visita da Companhia da Direção-Geral de Saúde a Reguengos de Monsaraz para dizer o óbvio e o circunstancial? Mas não se pense que é só o lar de Reguengos que é notícia pelos piores motivos. Os casos em lares sucedem-se. Desde o início da epidemia, cerca de 40% das vítimas mortais de Covid-19 em Portugal eram residentes em lares. O país não é para velhos! E, “the last but not the least”, o caso dos exames nacionais e as “notas” obtidas são um verdadeiro atentado à inteligência dos portugueses. Através de um golpe de asa passou-se num ápice de avaliações negativas para o sucesso completo. Houve casos de escolas com pautas repletas de vintes. Na Madeira contaram-se 107! Mas quem pode acreditar nesta aldrabice. Os alunos, pais e encarregados de educação podem regozijar-se pelos resultados obtidos. Mas é tudo capcioso e sem qualquer valor. Todos irão pagar caro esta festança. Qualquer semelhança com as passagens administrativas, de que tanto falaram, é só pura coincidência. O país foi a banhos e come bolas de Berlim!

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Jorge Noutel

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