A Guarda de há 21 anos para cá… O que dizer? O saudosismo, tão típico dos demagogos populistas de hoje em dia, levar-nos-ia a pensar que antigamente tudo era melhor e, afinal, até perdemos população. Mas a Guarda é hoje uma cidade mais bonita, mais urbana, com melhores cuidados de saúde (temos um Hospital Novo), atrativa, mais empreendedora, com maior acessibilidade rodoviária, ferroviária e digital.
Mas estaremos assim tão diferentes? Ter-se-á operado alguma mudança de mentalidade? O progresso encontrou-nos? Embora não haja uma resposta clara, é óbvio, para mim, que a Guarda, assim como a região que a rodeia, não ganharam, afinal, dimensão.
É indubitável que temos uma preponderante presença na comunicação social nacional, mas, com que propósito? Será que temos ganhos emocionais, económicos ou sociais com isso?
É certo que, nos últimos anos, não ganhámos dimensão estratégica, nem ganhámos peso político: perdemos um deputado, não ganhámos peso decisório na governação, mesmo alojando uma Secretaria de Estado.
A Guarda continua a ser recetáculo para candidatos aos mais diversos órgãos e a desvalorizar aquilo que temos de mais nosso – as nossas gentes.
As direções nacionais dos partidos decidem a seu bel prazer, cilindrando aquilo que são as decisões locais, esta tem sido uma sina inexorável e cíclica.
A mentalidade continua a dos sítios pequeninos, chamemos-lhe provincianos, não num sentido necessariamente pejorativo, mas a verdade é que desvalorizamos tudo aquilo que se faz cá pelo burgo, as personagens que nos são mais próximas nunca são tidas como tão meritórias quantos aquelas que estão longe, quando, na realidade, a única coisa que muda é efetivamente a distância. Temos potencial para muito mais, mas descartamo-lo por questões de invídia.
Lembro-me de discutir com o diretor deste jornal o quanto era importante ganhar dimensão e ter um órgão de comunicação social que não fosse só para a Guarda, mas eventualmente para o Interior do país.
Só com maior dimensão poderemos ter peso social, político e económico para fazer ouvir a nossa voz, isso faz com que tenhamos que ultrapassar os nossos atavismos e saibamos unirmo-nos, dando protagonismo a quem se revelar merecedor.
Precisamos de criar valor acrescentado ao investimento que cá existe.
Há duas décadas atrás escrevi sobre a Faculdade de Medicina e como foi relevante a coragem política de colocá-la aqui. O ensino administrado põe os seus alunos ao nível dos melhores. Mas faltam investimentos paralelos de rentabilização, como incentivos para a fixação de médicos, de índole financeira, de progressão académica e profissional. Isso só será possível se formarmos aqui os especialistas.
Outro exemplo paradigmático: o designado “Movimento pelo Interior”, que lançou bases daquilo que poderia ser um verdadeiro roteiro das necessidades mais imperiosas destas regiões, acabou, no final, por dar uma mão cheia de pouca coisa. Aquilo que se impunha, era que se facilitasse o investimento privado de forma honesta, eficaz e comprometida e se fizesse investimento público de forma real. Faltou, mais uma vez, coragem (leia-se, vontade) política.
Muito embora esteja, teoricamente, apontada, a direção não foi seguida e, sinceramente, não creio que o venha a ser, a não ser que a nossa vontade comece a obrigar os governantes, que continuam no Terreiro do Paço, a segui-la.
Pouco mudou nestas duas décadas. Mas sou um otimista e se na matriz tudo parece idêntico, há pequenas nuances que, na realidade, são embriões daquilo que acontecerá no futuro e que será sempre positivo; maior riqueza, orgulho, literacia, melhores cuidados e melhores cidadãos. É isso que vamos ter na Guarda, se a nossa vontade persistir, forte!
*Médico e antigo colaborador de O INTERIOR