O pátio das cantigas

“Pessoas que usam máscara quando andam sozinhas na rua ou dentro do carro são a prova cabal de que o seu uso não é apenas uma imposição tirânica da governação.”

De regresso a Portugal, deparo-me com cenários a que não estava já habituado, nomeadamente pessoas mascaradas e jornalistas amordaçados. E ambos de forma totalmente voluntária.
Países há onde os jornalistas são presos ou despedidos para se manterem em silêncio. Em Portugal, são as direcções editoriais de jornais de referência que apagam textos controversos, são os comentadores que aceitam transformar o congresso do PS num circo sobre a sucessão de Costaline daqui a 2 ou 6 anos em vez de promoverem qualquer escrutínio da governação, são os entrevistadores que aceitam tudo o que lhes é dito sem o mínimo de contraditório.
Sobre o amordaçamento da população, e sem falar da rebeldia colectiva da Arménia, onde a máscara é acessório para assaltos a bancos, conheci outros lugares mais europeizados, como Vilnius ou Riga, onde há muito que o uso da máscara ao ar livre desapareceu. Com a entrada em vigor dos certificados digitais, discutivelmente usados para segregar pessoas, há pelo menos uma atitude coerente. Se todas as pessoas estão imunizadas ou negativas, também não é necessário cobrir a cara, mesmo em espaços fechados.
Sei que o leitor português está neste momento horrorizado com o parágrafo anterior, porque a Drª Graça Freitas lhe disse para considerar um negacionista do Covid qualquer pessoa que duvide das suas certezas, que geralmente mudam de duas em duas semanas.
Diz a imprensa que, por mera tecnicalidade – a lei foi feita para três meses –, o Governo e o Parlamento não puderam mudar a regra do uso obrigatório da máscara em espaços abertos. Isto mostra apenas que os deputados fizeram esta lei com o princípio “se calhar não vai ser preciso, mas mais vale limitações a mais do que liberdade em excesso” e que os jornalistas se comprazem com tudo o que o doutor Costa decide em matérias de saúde pública. Manter as pessoas açaimadas com máscaras cirúrgicas é coisa que, obviamente, satisfaz quem manda, e – não há como não o dizer – quem obedece. Pessoas que usam máscara quando andam sozinhas na rua ou dentro do carro são a prova cabal de que o seu uso não é apenas uma imposição tirânica da governação. O medo sempre deu bom resultado.
Felizmente, a lei permite uma excepção. A máscara é opcional se for possível o distanciamento. Ora, este articulado torna obrigatório que eu não me aproxime das pessoas. Andar sozinho deixou de ser uma esquisitice minha e passou a ser o escrupuloso cumprimento da legislação.

* O autor escreve de acordo com a antiga ortografia

Sobre o autor

Nuno Amaral Jerónimo

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