O liceu da Guarda foi sempre um marco na vida do estudante. Não era apenas pela formação académica e o acesso a novos mundos que propiciava, era também pela maneira de estar, sentir e viver, e pela relação de envolvência com a cidade da Guarda. Não era efémera, era duradoura! É verdade que a cidade era pobre, apenas rica quando comparada com a aldeia, e obrigava a procurar noutras paragens o emprego que o liceu tinha propiciado, mas quem por aqui passou ficou marcado pelo apelo do regresso, nem que seja num dia de romagem, para sentir e partilhar saudades. Foi isso que os finalistas do liceu de 1972/73 fizeram no dia 29 de abril de 2023. De todas as partes do país, quem pode não deixou de estar presente, e foram muitos. Mas, já lá vão 50 anos, e muitos já partiram para outro Reino, mas não deixaram de ser lembrados. Com saudades mitigadas, e um grande sucesso na romagem, ficou já marcado novo encontro.
O princípio
Os liceus, escolas públicas destinadas a preparar e permitir o acesso ao ensino superior, foram criados em 1836 por Passos Manuel. No entanto, por razões de ordem política, e sobretudo económica, a sua implementação foi-se arrastando ao longo de décadas.
O liceu da Guarda foi criado, e terá funcionado pela primeira vez, no ano letivo de 1848/49, ainda de uma forma embrionária e precária, pois não tinha instalações próprias, apenas uma secretaria para realização de exames.
Mas onde seria essa secretaria? Com toda a probabilidade, seria uma sala do Governo Civil, que então se encontrava instalado numas casas na Rua de S. Vicente. Já havia reitor e dois ou três professores para as seis cadeiras de então.
Os professores davam aulas nas próprias habitações e os alunos faziam exames na secretaria perante o reitor, quando os dessem por habilitados, pois não havia época certa de exames. E não se julgue que era uma exceção, era normal, acontecia por todo o país, pois não havia instalações disponíveis nem dinheiro para as construir.
Instalação definitiva
A instalação definitiva ocorreu a 3 de agosto de 1855. Para esse efeito, o reitor, cónego Carlos Correia Leitão, prior da Sé, já de nomeação anterior a 26 de fevereiro de 1851, reuniu com os três professores existentes a esse tempo, mais o secretário interino, na sua casa de habitação, situada entre a Rua Direita e a do Comércio, onde veio a instalar-se a Associação Comercial da Guarda.
Os professores eram João Batista Ferrão, José Borges Cardoso e António das Neves Canaveira, e o secretário, o padre Francisco Martins Lucas.
No entanto, repare-se, os autos de posse do professor Borges Cardoso e do secretário interino já tinham sido feitos antes na secretaria do liceu, escritos e assinados por Joaquim de Andrade Júnior, oficial maior do Governo Civil. Também os assentos dos exames feitos perante o reitor desde 27 maio de 1851 até 23 de setembro, foram feitos na secretaria do liceu.
Instalações
As primeiras instalações, com a secretaria ainda nas casas do Governo Civil, seriam duas ou três salas de aulas, que, segundo afirmou Artur de Andrade Sampaio ao dr. José de Almeida, ficavam numa casa do Largo de S. Vicente, onde hoje se encontra o restaurante “Belo Horizonte”.
Fosse ou não, a ideia generalizou-se, passando a ser dada como real. Certo é que, em 1860, o liceu estava já de malas aviadas para o Seminário, onde passou a ocupar três salas do rés do chão e mais uma outra cedida pelo prelado. Davam para a Rua do Paço do Bispo (atual Alves Roçadas) e Travessa do Seminário (atual Rua de S. João de Deus).
Os primeiros professores
Os primeiros professores foram João Batista Ferrão, José Joaquim Borges Cardoso e António Coelho das Neves Canaveira. A língua francesa teve primeiros alunos em 1863/64 e a inglesa, de 1886/87, sendo professor João Godinho Soares de Albergaria. As primeiras professoras foram Cármen de Paiva Garcia, Inês Machado, Emília Lopes Furtado e Beatriz Sampaio Salvador, todas no ano letivo 1930/31.
Os primeiros alunos
A primeira matrícula é de António Giraldes, da Guarda, data de 1856.
O liceu destinava-se exclusivamente a alunos, mas a partir de 1895 aparecem as primeiras matrículas femininas, que décadas depois iriam ultrapassar a frequência masculina.
Um liceu de raiz
O atual liceu teve projeto do arquiteto António Maria Veloso Gomes (1965), sendo construído na zona da mata municipal. Foi inaugurado em junho de 1969, tendo a transferência ocorrido no ano letivo de 1969/70.
*Investigador da história local e regional