1. Fez agora um ano que a Europa está em guerra. Sombras negras desceram sobre o continente, 80 anos depois. Por culpa de um homem e da sua cleptocracia expansionista. Os mais cínicos, os jesuítas narcísicos, alguns paródicos generais da TV, alguns ególatras disfarçados de franciscanos, os mal-intencionados, os populistas e os facciosos, dizem que foram os EUA, a NATO, a UE e os “nazis” que começaram isto. Tudo o resto, ou seja, 98% da população ocidental sabe quem começou, quem foi vítima da agressão, quem quer realmente viver em paz, quem vive obcecado com sonhos imperiais, à custa do sofrimento (incluindo do seu próprio povo), do genocídio, da usurpação e da mentira, quem trava uma luta que é de todos nós. Muito está em jogo. Apoiar a Ucrânia é garantir o nosso futuro. Tudo o resto é propaganda de néscios.
2. O radicalismo ideológico tornou-se a marca de água do PS. Motivo? As reacções internas ao desastroso pacote de medidas na Habitação, anunciado pelo Governo. Quase todas provenientes da ala pedronunista. Alexandra Leitão e a ministra do sector descobriram agora que o direito à habitação prevalece sobre uma série de outros. A preocupação dessas figuras não é a mais que certa inconstitucionalidade de algumas medidas, mas o nível de exigência a que o Estado será chamado a intervir e a que poderá não ser capaz de responder. Já Isabel Moreira veio a terreiro com a “natureza social” da propriedade privada. Que não é direito absoluto, pois “não há direitos absolutos”, segundo ela. Excepto o direito à habitação, é claro. Na verdade, esta relativização ideológica do núcleo duro das liberdades individuais assenta que nem uma luva as teses centralistas e colectivizantes que vão tomando conta do PS. Porque são a última barreira contra um Estado invasivo e asfixiante, que realmente querem implantar. A começar pela liberdade de expressão e acabando agora nesta ofensiva à liberdade de iniciativa económica e à propriedade privada. A cúpula socialista já só consegue atrair para a governação o refugo do aparelhismo. Pessoal político cuja motivação é 80% pessoal e 20% ideológica. E assim reduz as propostas de políticas públicas a apresentações de PowerPoint, como se viu. Sem estudos e metas consistentes. As nomeações de familiares a amigos na administração central e periférica, pelo poder socialista, são uma afronta a quem nada teve de mão beijada. Reflectem o imobilismo que serve quem se sente confortável num status quo que os beneficia e os preserva do risco. Ou seja, só ousam tocar numa repartição do bolo, desde que a sua parte não diminua. Porque vai tudo bater aqui. Os socialistas não se preocupam em aumentar o bolo, para que as várias fatias aumentem em proporção. Interessa-lhes é a forma como a repartição é feita. Ou seja, a proporção é a mesma, independentemente do tamanho do bolo objectivo. Desde que tal satisfaça clientelas e assegure eleitorados. Entretanto, o país estagna porque substituiu o crescimento pela redistribuição de rendas e dividendos.
3. O ChatGPT tem passado relativamente despercebido nos fóruns e redes sociais. Trata-se de um protótipo de um chatbot com inteligência artificial desenvolvido pela OpenAI, com um banco de dados gigantesco. Foi lançado em Novembro de ano passado e a Microsoft e a Google já entraram na corrida. O chatbot é um modelo de linguagem ajustado às solicitações e permanentemente actualizado. Do género “pergunte, que nos respondemos”. E é possível fazer todo o tipo de questões. Sucedendo-se um diálogo supervisionado e por reforço. Experimentei pedir um comentário sobre a Guarda, que saiu assim: «A Guarda é uma cidade encantadora localizada no Centro de Portugal, conhecida por sua história rica e bela paisagem montanhosa. É situada na região montanhosa da Serra da Estrela e oferece uma vista espetacular sobre as montanhas circundantes. A cidade é conhecida por sua arquitetura histórica, incluindo a Fortaleza da Guarda, uma das maiores fortificações da Europa construída no século XV. Além disso, a cidade é também conhecida por sua culinária local, incluindo pratos típicos como o cozido à portuguesa e o ensopado de borrego, bem como vinhos produzidos na região». Que tal? Tirando o exagero da fortificação, a sua datação e o cozido à portuguesa, nem está mal.
4. Sofrer bem é sofrer devagar. Nada de diletantismos ao sabor da época. É preciso visitar locais estranhos. Colorir fábricas abandonadas. Percorrer falésias com que nunca sonhaste. Comprar um livre passe para circular onde nunca ousaste entrar. Esfregar a cara na tua miséria, na tua fatuidade, na tua hesitação, na tua cobardia, na tua insuportável vaidade. Evitar as passadeiras de veludo, os alçapões e os muros que cuidadosamente criaste ao longo do tempo, para apagar a mentira que tomou conta de ti, como uma doença de pele. Mas não receies. Se chegaste a ver um monstro reflectidos nos espelhos que restaram, foi porque em ti ainda há uma mesa sempre posta, um verão que nunca partiu, uma sela sempre arreada. Só então perceberás que o lugar das vitórias é exactamente o mesmo das derrotas. Só então, dos escombros, ousarás erguer o poema.
* No calendário das árvores celta, corresponde ao freixo
** O autor escreve de acordo com a antiga ortografia