Negócio de bicicletas

Escrito por Fidélia Pissarra

A primeira das três bicicletas saiu a custo de dentro do carro. As rodinhas, para impedir que se caísse antes de o equilibrar na pedalada, empancavam nos bancos dificultando a tarefa. Passados uns meses, esta mesma bicicleta, haveria de passar mais tempo na oficina, ao lado do Café Mondego, em sucessivas indecisões de agilidade e do permanecer ou tirar das rodinhas, do que a ser pedalada no passeio em frente à esquadra. A segunda, com “encosto” e mudanças, era demasiado grande e pesada para andar escadas acima e abaixo e nem se conseguir chegar com os pés ao chão a partir do selim. A terceira, maior que a primeira e mais leve que a segunda, acabaria por se tornar a favorita das viagens entre o largo de S. Pedro e o “atrás” da Sé. Bem como, está claro, à oficina ao lado do café Mondego para afinar travões.  

Naquela altura, o frio e talvez a inclinação da barreira do Hotel Turismo não conseguiam convencer grande gente a deslocar-se de bicicleta pela cidade. O exercício de pedalar era quase um exclusivo de crianças e a essas, no fandango de pôr as bicicletas na rua, tirar e pôr rodinhas, afinar travões, decidir onde ir andar nelas e depois voltar a metê-las em casa, nunca ocorreu pensar que uma bicicleta, além de brinquedo, podia ser um meio de transporte. Precisamente o meio de transporte que, hoje em dia, os guardenses aparentemente só não utilizam para ir trabalhar, porque não há cá uma ciclovia. Pois, apesar de muitos terem de deixar primeiro os filhos na escola, outros sofrerem de reumatismo e não lhes cair lá muito bem a neblina das manhãs, alguns já não terem sequer força para pedalar até ao cimo da rua e outros tantos ainda não terem percebido como se hão de equilibrar, sem rodinhas, entre os sacos das compras, se houvesse uma ciclovia era a bicicleta o meio de transporte mais utilizado por aqui. Mas a coisa, como quem diz a moda, faz-se.

Aos guardenses, em nome da vida saudável e do ambiente, para que passem todos a deixar os carros em casa, deixarem de se deslocar nos autocarros urbanos e passar a ir de bicicleta para todo o lado, já está prometida a construção da “sua” ciclovia. Consta que com três metros de largura, a começar na rotunda dos Bombeiros e a terminar na rotunda do Bairro de São Domingos e ligações ao IPG, ao Parque da Saúde, aos bairros das Lameirinhas, do Torrão, Sra. dos Remédios, Alfarazes, Pinheiro, Guarda-Gare, Parque Urbano do Rio Diz e ao parque industrial. Se vai também ter ligação da rotunda dos 5F’s à VICEG é que já não sei. Acho é que, se aos ciclistas do recreio passado estrada da Santa Cruz abaixo, estrada da Santa Cruz acima, se se juntarem os ciclistas da tal ciclovia para trás e para adiante, voltar a abrir uma oficina de bicicletas, ao lado do Café Mondego, que já não existe, até seria capaz de ser uma boa ideia de negócio. Pelo menos sempre se podiam ir afinando os travões, durante o cafezinho da manhã, para evitar as quedas nas descidas de regresso a casa.

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Fidélia Pissarra

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