Não é por acaso que as tragédias (e também as comédias…) gregas continuam hoje a ser representadas em todo o mundo culto. Apesar do radical anacronismo dos contextos em que decorre a ação, há nelas algo que em dois mil e quinhentos anos pouco ou nada mudou, e que, por isso mesmo, as torna eternas e, portanto, sempre atuais: a natureza humana.
Vem isto a propósito da Escola Profissional da Guarda, entidade de formação criada pela Fundação João Bento Raimundo, ter anunciado recentemente que vai criar no próximo ano letivo mais dois cursos – Técnicos de Manutenção de Energias Renováveis e Técnicos de Optometria – este último com aulas na Universidade da Beira Interior (UBI), na Covilhã.
É esta disponibilidade e iniciativa permanente da Escola Profissional da Guarda para enviar alunos para a UBI, em detrimento do Instituto Politécnico da Guarda (IPG), que vale a pena avaliar. A Escola Profissional da Guarda está, como o próprio nome indica, na Guarda, e o IPG tem competências, professores e laboratórios em imensas áreas nas quais a Escola Profissional dá formação. Resulta por isso incompreensível a forma como esta escola – que até recebe apoios públicos da Câmara Municipal da Guarda… – se obstina e persevera em virar as costas ao estabelecimento de ensino superior da cidade, o qual, geograficamente, dista de si apenas um quilómetro (menos de 15 minutos a pé), enviando sistematicamente alunos para a Covilhã.
A razão deste afastamento parece residir, apenas e tão só, no facto de o fundador, patrono vivo e presidente da Fundação João Bento Raimundo, o próprio João Bento Raimundo (que também é o diretor da Escola Profissional da Guarda), ter sido o primeiro presidente do IPG e de, após a sua saída, ter ficado pessoalmente com uma relação mal resolvida com a instituição.
Ora isto é lamentável! E é-o principalmente por a Escola Profissional da Guarda, e também a Fundação João Bento Raimundo, terem desempenhos meritórios nas respetivas áreas de atuação – um ponto que deve ser explicitado e é merecedor de elogio. O problema para a Guarda surge, precisamente, de ressentimentos pessoais dominarem relações institucionais que podiam, e deviam!, ser de colaboração e intercâmbio.
Tal como nas tragédias gregas, os procedimentos normais, racionais e sensatos têm o caminho vedado pelos lados menos luminosos da natureza humana (e talvez o curso de Optometria até seja pior exemplo do que muitos outros…). Diz o povo: “Não peças a quem pediu, nem sirvas a quem serviu”. Assim está João Raimundo em relação ao Politécnico da Guarda.
* Dirigente sindical