1- A recuperação da atividade económica pós-crise tem-se consolidado, sendo o setor da construção um dos exemplos. A confirmar isso mesmo, o investimento realizado na construção registou, nos primeiros três meses deste ano comparativamente ao mesmo período de 2018, a maior subida homóloga desde 1997.
Deixando de parte os argumentos relativos ao facto deste crescimento de 12,4% permanecer aquém do necessário para um crescimento económico mais sustentado de Portugal e ao ainda necessário reforço do parque habitacional (sobretudo a destinar ao arrendamento acessível, quer via novas construções de raiz ou reabilitações), fica o receio de que sejam repetidos os erros do passado.
Num país em que a proximidade e conivência entre decisores políticos (mormente autárquicos) e patos bravos convertidos em grandes empreendedores gerou investimentos despiciendos, muitos dos quais ainda em pagamento por todos nós, e desfigurou paisagens hoje irrecuperáveis, todo o cuidado é pouco.
Num país que ignora o que é ou para que serve o ordenamento, é preciso cuidar que os planos diretores municipais não são ajustados à medida de interesses trapaceiros, que as autorizações de urbanizações não olham somente ao interesse do promotor mas das populações (isto é, do país).
Até o leitor mais desdenhoso da agenda mediática estranhará a oportunidade de observações tão óbvias. E com razão. Mas bastam algumas viagens pelo país, em particular no litoral, e em especial nas zonas de maior atração turística, para perceber que a construção sem freio ameaça estragar ainda mais um país já fustigado por zonas industriais que são habitação (mal) encapotada, por bairros que são uma espécie de Benetton sem gosto e mamarrachos em cima de praias (e sim, ainda se faz nova construção junto a praias, inclusivamente em áreas “alegadamente” protegidas).
A construção desregulada dos anos 1970 e 1980 deu lugar uma construção regulada nos anos 1990 que em pouco ou nada regulou os erros cometidos no passado. Hoje, o país continua a pagar, monetária e visualmente, esses erros.
2- A reanimação da construção é determinante para melhorar o potencial de crescimento do produto e, na realidade atual, crucial para suprir as necessidades gritantes de habitação não direcionada a chineses e franceses “gold”, mas às famílias da classe média. Pena faltar a muleta do investimento público.
Sabendo disso, o PS vai incluir nas propostas que leva às legislativas um programa de reabilitação do edificado em meios mais pequenos, como vilas e aldeias. Uma ideia relevante e a única forma de garantir (a par da criação de empregos) a fixação de pessoas no interior do país, que o PS quer articular com políticas de coesão territorial para dar um impulso a estas zonas esquecidas.
Só que este é o mesmo PS que apoia um Governo que criou um programa de arrendamento acessível em que um T0 pode custar até 600 euros em Lisboa. Programa este que visa apoiar a classe média e os jovens, precisamente os mesmos que a ele não poderão aceder.